Maestro da mais longeva orquestra de bailes do País, a Tabajara, o pernambucano Severino Araújo, 95 anos, morreu na noite desta sexta (3), no Rio, vítima de falência múltipla de órgãos.
Ele estava internado no hospital Ipanema Inn há 15 dias e afastado do comando da banda há cinco anos, por problemas de saúde que foram se agravando.
Filho de um mestre de banda de Limoeiro, no Agreste, Araújo aprendeu música durante a infância, inicialmente como clarinetista, e assumiu o comando da Orquestra Tabajara em 1938, aos 21 anos, quatro anos após sua criação, em João Pessoa.
Severino transformou o grupo de jazz tradicional em um conjunto brasileiro com linguagem própria, interpretando sambas, valsas e choros. Ao longo de sete décadas, gravaram mais de 100 discos e continuam na estrada. Liderou por quase seis décadas o conjunto, até que um problema na perna o deixou com dificuldades de locomoção e o fez passar o comando para seu irmão Jaime Araújo.
Severino Araújo era casado com Neuza Monteiro, 85, sua segunda mulher, e deixa quatro filhos: Tânia, Ronaldo, Francisco e Ieda – os dois últimos, de seu primeiro casamento. O corpo do maestro foi sepultado este sábado (4), ao meio dia, no cemitério São João Batista, em Botafogo, no Rio.
Em 15 de junho de 2010, a TV Cultura levou ao ar, no programa Mosaicos, o especial “A arte de Severino Araújo e Orquestra Tabajara”, um documentário musical narrado por Rolando Boldrin, que resgata a história e a obra dos homenageados.
Dirigido por Nico Prado, o programa recupera imagens históricas do artista. Também promove o encontro inédito de Jaime Araújo, Spok e Proveta, da Banda Mantiqueira.
Eles falam sobre a importância de Severino para a música brasileira e interpretam três clássicos de autoria do maestro pernambucano: Relembrando o norte, Espinha de bacalhau e Chorinho em Aldeia.
O maestro Severino Araújo tinha dez anos a menos do que o frevo. Há 74, ele estava à frente da Orquestra Tabajara, uma lenda na música brasileira – ambos, o maestro e a orquestra. Aos 90 anos, convalescente de uma operação no joelho, ele alterou uma rotina iniciada no final dos anos 30.
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TRAJETÓRIA - Severino Araújo teve uma trajetória parecida com a de Capiba, cujo pai exercia a mesma profissão. Ainda criança, a família de Severino Araújo mudou-se para a pequena Ingá, no interior da Paraíba. Foi ali que se destacou como clarinetista, a ponto de sua fama chegar à capital do Estado e receber convite para integrar a Banda da Polícia Militar.
A carreira recordista de Severino Araújo com a Orquestra Tabajara começa em 1937, João Pessoa, quando foi contratado como clarinetista da PRI-4, emissora do governo do Estado, a Rádio Tabajara. E no ano seguinte, com o falecimento do maestro Luna Freire, ele foi convidado para reger a orquestra, da qual passou afastado um ano, quando foi contratado pela poderosa Rádio Tupi, do Rio.
Na então capital federal, Severino Araújo logo tornou-se requisitado como músico e arranjador, e gravou seus primeiros discos. A estreia, com frevo, naturalmente. Com o cantor Déo, no vocais, e uma orquestra de estúdio lançou “Eu vou pra Pernambuco”, em outubro de 1944.
O primeiro sucesso foi Chorinho em Aldeia, composto quando ele serviu o Exército no Recife (Aldeia a que se refere é o bairro de Camaragibe, embora o batalhão em que serviu fique em Paudalho).
A orquestra foi para o Rio em 1945. Ela e seu maestro nunca mais se separaram desde então.
Em 2007, ele concedeu entrevista ao JC: “Eu não sou o mais indicado para falar da história do frevo. Meu pai é que foi um grande compositor de frevos”, disse, modesto, em entrevista por telefone. Mas não demorou a lembrar que a Orquestra Tabajara gravou muitos frevos, e que ele compôs alguns clássicos do gênero, e pelo menos um álbum antológico, A Tabajara no frevo (Continental, 1956).
Selo do disco de 78 rotações – pela gravadora Continental. O frevo, “Furiosa” um clássico dos carnavais pernambucano, é de autoria maetro Zumba (José Gonçalves) |
É deste álbum um dos frevos mais regravados de Severino Araújo, Relembrando o Norte, “Esta música eu ainda fiz em João Pessoa, com o nome de Frevo de Cabo Branco, mas como ninguém no Rio sabia o que era Cabo Branco, mudei para Relembrando o Norte”, revelou o maestro.
Para ele foi a força das escolas de samba que barrou o sucesso do frevo no Rio:
“As escolas estão pelo Brasil todo, são muito poderosas. Mas quando chegamos aqui, em 1945, contratados pela Rádio Tupi, fizemos sucesso tocando frevo. Ficamos seis meses fazendo bailes com frevos, e o que o patrocinador nos pagou deu para juntar uns bons cruzados (sic), e ainda sobrou dinheiro para a Tupi”, conta.
Com um dos currículos mais ricos da MPB, gravando com praticamente todos os grandes nomes da era do rádio, o frevo nunca saiu do repertório da Orquestra Tabajara. Foi acompanhada pela orquestra de Severino Araújo que Carmélia Alves emplacou um sucesso, em 1954, com o frevo-canção “Casa de Noca” (de Capiba).
Quando soube que no Recife as escolas de samba não têm mais tanta força, ele emendou:
“Nem o frevo. A última vez que a Tabajara fez Carnaval no Recife foi em 1977. Sei que o frevo não toca mais por aí. E isso acontece porque os grandes compositores morreram, existem poucos dos cantores do passado, e as orquestras desapareceram. Mas não foi só por causa do fim dos bailes de Carnaval, e sim porque os clubes de pedestres que saíam levando o povo pela rua, com boas orquestras, também desapareceram”, analisou.
O mais idoso compositor de frevo, que entrou para a história, não aprovava muito o que lhe tem chegava de Pernambuco: “Ouço pouco, mas acho um frevo errado, é muito corrido. No último Carnaval vi o Recife na TV, mas quando a orquestra toca é muito ligeiro, não era assim o frevo que conheci”.
Severino Araújo (1917 -2012)
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