5 de jun. de 2009

OBAMA: "Nossas filhas são tão capazes quanto nossos filhos..."

OBAMA: "Nossas filhas são tão capazes quanto nossos filhos..."
Dircurso Obama no Cairo Parte III

Foto: Reuters

Obama propôs um "novo começo" entre os Estados Unidos eo mundo muçulmano

Fonte: Estadão

O quinto tema que devemos abordar juntos é a liberdade religiosa. O Islã tem uma orgulhosa tradição de tolerância. Ela pode ser vista na história da Andaluzia e de Córdoba durante a Inquisição. Testemunhei esta tolerância em primeira mão quando era criança na Indonésia, onde os devotos cristãos desfrutavam da liberdade de culto num país de esmagadora maioria muçulmana. Este é o espírito que necessitamos hoje. As pessoas de todos os países devem ser livres para escolher e professar sua fé com base na persuasão do intelecto, do coração e da alma. Esta tolerância é essencial para a prosperidade da religião, mas ela enfrenta atualmente muitos desafios.

Entre alguns muçulmanos, existe uma tendência perturbadora de medir a própria fé pela rejeição da fé de outra pessoa. A riqueza da diversidade religiosa deve ser sustentada - seja para os maronitas no Líbano ou para os coptas no Egito. Se formos honestos nestas pretensões, devemos também selar as cisões também entre os muçulmanos, pois a divisão entre sunitas e xiitas levou à uma violência trágica, especialmente no Iraque.

A liberdade religiosa é fundamental para a capacidade de convivência dos povos. Precisamos examinar todas as maneiras de protegê-la. Nos Estados Unidos, por exemplo, a legislação que rege as doações de caridade dificultam para os muçulmanos o cumprimento das suas obrigações religiosas. É com isso que estou comprometido a trabalhar com os muçulmanos americanos para garantir que eles possam contribuir com o zakat.

Da mesma maneira, é importante que os países ocidentais evitem impedir os cidadãos muçulmanos de praticar sua religião como bem entenderem - ditando, por exemplo, o vestuário de uma mulher muçulmana. Não podemos disfarçar com supostas pretensões liberais a hostilidade diante de uma religião.

Na verdade, a fé deveria nos aproximar. É por isso que estamos estabelecendo projetos de serviço social nos Estados Unidos para promover a aproximação entre cristãos, muçulmanos e judeus. É por isso que damos as boas-vindas a iniciativas como o diálogo inter-religioso proposto pelo rei Abdullah, da Arábia Saudita, e a liderança turca da Aliança das Civilizações. Em todo o mundo, podemos transformar o diálogo em serviço comunitário inter-religioso, para que as pontes entre os povos levem à ação - seja no combate à malária na África, ou na prestação de ajuda humanitária após um desastre natural.

Foto: AP

Mulheres assistem ao vivo, discurso de Barack Obama em uma loja de temperos, na cidade portuária de Sidon, no Líbano.

O sexto tema - o sexto tema que desejo abordar diz respeito aos direitos da mulher.

Eu sei, e olhando para esta plateia, percebemos que este assunto é tema de um debate saudável. Eu rejeito a opinião de alguns no Ocidente, que acreditam que uma mulher que escolhe cobrir o próprio cabelo seja de alguma maneira menos igual, mas acredito que uma mulher que seja privada da educação seja também privada da igualdade. Não é coincidência o fato de os países onde as mulheres recebem a melhor educação apresentarem uma maior probabilidade de prosperidade.

Para que não haja dúvidas: os temas relacionados à igualdade das mulheres não são de maneira alguma um problema exclusivamente para o Islã. Na Turquia, no Paquistão, em Bangladesh, na Indonésia, vimos países de maioria muçulmana elegerem mulheres como líderes. Enquanto isso, a luta pela igualdade das mulheres prossegue em muitos aspectos da vida americana, assim como em países de todo o mundo.

Estou convencido de que nossas filhas são tão capazes de contribuir com a sociedade quanto os nossos filhos. Nossa prosperidade comum avançará quando permitirmos a toda a humanidade - homens e mulheres - que atinja o seu potencial pleno. Não acredito que as mulheres tenham de fazer as mesmas escolhas que os homens para serem consideradas iguais, e respeito as mulheres que optam por desempenhar seus papéis tradicionais. Mas isto tem que ser uma escolha delas. E é por isso que os Estados Unidos serão parceiros de qualquer país de maioria muçulmana no incentivo à escolaridade plena para a meninas, e no auxílio às jovens que buscam emprego por meio de um micro financiamento que ajude as pessoas a concretizar seus sonhos.

Finalmente, quero discutir o desenvolvimento e as oportunidades econômicas. Sei que para muitos, a face da globalização é contraditória. A internet e a televisão podem trazer ao lar o conhecimento e a informação, mas também a sexualidade ofensiva e a violência gratuita. O comércio pode trazer nova riqueza e oportunidade, mas também imensas disrupções e transformações nas comunidades. Em todos os países - incluindo os Estados Unidos - esta transformação pode provocar medo. Medo de, por causa da modernidade, perdermos o controle sobre nossas escolhas econômicas, nossa política, e principalmente nossas identidades - as coisas que mais valorizamos nas nossas comunidades, nossas famílias, nossas tradições, e nossa fé.

Foto: AP

O líder libanês sunita Sheikh Maher Hammoud assiste ao discurso de Obama

Mas sei também que o progresso humano não pode ser negado. Não precisa haver contradição entre desenvolvimento e tradição. Países como Japão e Coreia do Sul vivenciaram um imenso crescimento econômico preservando ao mesmo tempo suas culturas distintas. O mesmo pode ser dito a respeito do impressionante progresso de países de maioria muçulmana, de Kuala Lumpur até Dubai. Em épocas passadas e nos tempos de hoje, as comunidades muçulmanas estiveram na vanguarda da inovação e da educação.

Isto é importante porque nenhuma estratégia de desenvolvimento pode se basear apenas no que brota do solo, nem se sustentará enquanto os jovens não tiverem um emprego. Muitos países do Golfo desfrutam de grande riqueza em razão do petróleo, e alguns começam a se direcioná-la para o desenvolvimento maior. Mas todos nós devemos reconhecer que educação e inovação serão moeda corrente no século XXI e que em muitas comunidades muçulmanas, o subdesenvolvimento persiste em muitas áreas. Estou enfatizando este investimento dentro do meu próprio país. E embora no passado os EUA tenham se concentrado na extração de petróleo e gás nesta parte do globo, agora procuramos um compromisso maior.

Na área de educação, expandiremos os programas de intercâmbio e aumentaremos o número de bolsas de estudos, como a que levou meu pai aos EUA. Ao mesmo tempo, estimularemos os americanos a estudarem em comunidades muçulmanas. E paralelamente ofereceremos aos estudantes muçulmanos a possibilidade de estagiar nos EUA; investiremos no ensino online para professores e crianças em todo o mundo; e criaremos uma nova rede online, para que um jovem do Kansas possa comunicar-se instantaneamente com outro jovem no Cairo.

No campo do desenvolvimento econômico, criaremos um novo corpo de voluntários na área do comércio para se associarem a outros voluntários em países de maioria muçulmana. Este ano, realizarei uma Cúpula de Empreendedores para identificar a possibilidade de aprofundar os vínculos entre líderes empresariais, fundações e empreendedores sociais nos EUA e nas comunidades muçulmanas de todo o mundo. Na área da ciência e tecnologia, destinaremos um novo fundo ao financiamento do desenvolvimento tecnológico em países de maioria muçulmana, e colaboraremos na transferência de ideias para o mercado para que seja possível criar mais empregos.

Abriremos centros de excelência científica na África, Oriente Médio e Sudeste Asiático, e escolheremos novos enviados no campo da ciência para colaborar com programas de desenvolvimento de novas fontes de energia, criar empregos verdes, informatizar documentos, para o tratamento de água e o desenvolvimento de novas culturas. Hoje, estou anunciando um novo esforço global com a Organização da Conferência Islâmica para a erradicação da pólio. E também ampliaremos a parceria com as comunidades muçulmanas para promover a saúde da mãe e da criança.

Foto: AP

Indianos muçulmanos membros da Darasgah-E-Akhbar-E-Ale Mohammed, ou a escola de pregação e ditos do profeta Maomé e sua descendência, assistem a uma transmissão ao vivo do discurso do presidente Barack Obama

Todas estas coisas precisam ser feitas por meio de parceria. Os americanos estão dispostos a se unirem a cidadãos e governos; organizações comunitárias, líderes religiosos, e empresas nas comunidades muçulmanas de todo o mundo para ajudar nosso povo na busca de uma vida melhor.

Não será fácil atacar as questões que acabo de descrever. Mas temos a responsabilidade de nos unirmos em nome do mundo que buscamos - um mundo em que os extremistas não mais ameacem nosso povo, e em que os soldados americanos terão voltado para casa; um mundo em que israelenses e palestinos tenham a garantia de um Estado próprio, e a energia nuclear seja usada para fins pacíficos; um mundo em que os governos sirvam seus cidadãos, e os direitos de todos os filhos de Deus sejam respeitados. São interesses mútuos. Este é o mundo que queremos. Mas só poderemos alcançá-lo juntos.

Sei que muitos - muçulmanos e não muçulmanos - questionam se teremos condições de conseguir este novo começo. Alguns estão ansiosos por atiçar o fogo da divisão e para impedir o progresso. Outros sugerem que tanto esforço não vale a pena, pois estamos fadados à discórdia e as civilizações estão destinadas ao confronto violento. Muitos outros ainda mostram-se simplesmente céticos quanto à possibilidade de se realizar uma mudança concreta. O medo é muito grande, e muita desconfiança que foi se acumulando ao longo dos anos. Mas se optarmos por permanecer atados ao passado, nunca caminharemos para frente. Quero dizer isto particularmente aos jovens de todo credo, de todos os países: Vocês, mais que qualquer outra pessoa, têm a capacidade de imaginar um novo mundo, de refazer este mundo.

Todos nós compartilhamos deste mundo apenas por um breve momento no tempo. A questão é saber se aproveitamos este tempo concentrados no que nos separa, ou se nos comprometeremos num esforço - um esforço sustentado - para encontrar um terreno comum, para cuidarmos do futuro que queremos para os nossos filhos, e respeitarmos a dignidade de todos os homens.

É mais fácil começar uma guerra do que terminá-la. É mais fácil culpar os outros do que olhar dentro de si. É mais fácil perceber o que é diferente numa pessoa do que descobrir as coisas que temos em comum. Mas nos devemos escolher o caminho certo, e não o caminho fácil. Há uma única regra no cerne de toda religião - fazer aos outros o que gostaríamos que os outros nos fizessem. Esta verdade transcende nações e povos - não é uma crença nova; não é negra, branca ou morena; não é cristã ou muçulmana ou judia. É uma crença que pulsou no berço da civilização, e que ainda bate nos corações de bilhões de pessoas em todo o mundo. É a fé nos outros, e é o que me trouxe até aqui hoje.

Nós temos o poder de fazer o mundo que queremos, mas somente se tivermos a coragem de partir para um novo começo, tendo em mente o que está escrito. O Sagrado Alcorão diz: "Humanidade! Nós vos criamos homem e mulher; e vos fizemos em nações e tribos para que possais conhecer um ao outro". O Talmude diz: "Toda a Torá tem como objetivo a promoção da paz". A Bíblia Sagrada diz: "Bem aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus". Os povos do mundo podem conviver em paz. Sabemos que esta é a visão de Deus. Agora esta deve ser a nossa missão aqui na Terra. Obrigado. A paz de Deus esteja com vocês. Muito obrigado."


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