4 de mai. de 2009

A nada sútil diferença entre Lula e Obama

A nada sútil diferença entre Lula e Obama

Fotos: AP e Reuters

Os jornalista Josias de Souza e Miriam Leitão, nos seus blogs comentam das relações dos presidentes Lula e Obama, com a imprensa.

Basta o título da matéria de Miriam,que fala da entrevista de Obama nos seus 100 primeiros dias de governo, para dizer tudo : Sutis Diferenças.

Josias fala só do presidente Lula, antes avesso a entrevistas, nos tempos do mensalão, hoje não pode ver um microfone apontado na sua direção. Nós batizamos a matéria de Josias de “Jogando conversa fora...” onde o assunto principal é a crise das passagens aérea no congresso, coisa que já criticou, já disse que não tinha nada a dizer, agora está dizendo que é normal.

Vejam as duas matérias abaixo, valem a pena.

Sutis diferenças
Mirian Leitão

Foto: Getty Images

Presidente Obama numa coletiva de imprensa, nos 100 dias de mandato, na sala de conferência da Casa Branca

Fontes: Blog Miriam Leitão

Barack Obama chegou pontualmente para a sua terceira entrevista coletiva em 100 dias. Falou inicialmente por três minutos, e deu a principal mensagem: ele não está satisfeito com o seu desempenho. Não se atrasou, aceitou o confronto direto com os jornalistas, não falou demais, não se deitou em autoelogios, encerrou a entrevista precisamente uma hora depois. Com quem ele não se parece?

Quando falou da oposição, o fez com respeito republicano. Lembrou que os americanos votaram pela mudança, mas que os republicanos, quando se opõem ao seu governo, “estão fazendo o que acham que está certo”.

Era sonho dourado do presidente Barack Obama fazer um governo bipartidário. Isso fracassou logo no começo, quando o plano de recuperação da economia não teve um único voto da minoria. Mesmo assim, ele não culpa a oposição quando fala do assunto.

Obama poderia fazer uma longa lista de feitos e de promessas cumpridas neste começo de governo. Dizer que anunciou o fechamento de Guantánamo, que terminou o início da retirada do Iraque, baniu a tortura, retomou as pesquisas com células-tronco, acabou com a censura aos cientistas nos estudos sobre mudança climática, incluiu a questão ambiental nos programas de estímulo econômico, mudou a atitude diplomática americana. Enfim, a lista das promessas cumpridas já é vasta. Mas Obama passou rapidamente por algumas questões, entre elas o susto do momento com a gripe suína, e abriu o espaço para perguntas diretas, ele próprio chamando cada jornalista.

Não há, lá, aquele aparato em que um locutor solene chama o jornalista, sem espaço para réplica, em raríssimas entrevistas. Lá elas são corriqueiras e fazem parte do trabalho de prestação de contas à sociedade através dos jornalistas.

Quando o repórter do Wall Street Journal perguntou, com ironia, o que ele pretende fazer como representante do acionista de empresas dos setores automobilístico e bancário — numa referência às intervenções do Estado na economia — Obama respondeu que pretende sair fora o mais rapidamente possível do negócio automobilístico e do financeiro, porque a interferência do Estado se justifica apenas na emergência da crise. Disse que não está ali para administrar empresas automobilísticas e bancos. Não deixou espaço para ambiguidades, não fez loas ao Estado como o condutor da economia, mas puxou orelha do setor privado, quando disse que se os japoneses podem construir carros baratos, híbridos, bem desenhados e fáceis de manejar, os americanos também deveriam ser capazes disso. Lembrou, ainda, que o contribuinte que pôs dinheiro nestas empresas, em momento de risco, tem que poder cobrar e ser informado do que se passa nelas.

Foto: Getty Images

Saiu-se bem num importante embate entre os jornalistas sobre a tortura a suspeitos de terrorismo. Um deles quis saber se o os “métodos duros” de interrogar prisioneiros não teriam salvado vidas e aumentado a segurança dos Estados Unidos. Ele foi enfático e direto. Fará tudo o que for necessário para aumentar a segurança dos Estados Unidos, mas não acha que a tortura — ele não usou eufemismos — seja um caminho para isso. Citou Churchill em plena Segunda Guerra, diante do terrível inimigo nazista, determinando que não fossem torturados os prisioneiros de guerra. Quiseram pôr o presidente na saia justa de criticar o governo passado por fazê-lo, e ele repetiu: “não vamos torturar”, independentemente da base legal que por acaso tenha havido. Diante de outra pergunta, do Time Magazine, disse que vai mudar a lei de segredos de estado, que os trâmites legais para isso estão sendo feitos.

O New York Times quis saber o que o tinha surpreendido na presidência e Obama disse que foi o número de problemas que encontrou. Contou que, no começo da campanha, pensava num número de assuntos críticos, como guerra do Iraque, crise econômica e reforma do sistema de saúde, mas encontrou um número muito maior de assuntos críticos. Agora, enfrenta mais uma emergência: a gripe suína.

Pouco falou do que é o seu mais fraco desempenho: a crise econômica. Mas não o fez porque foi pouco perguntado sobre o assunto e este era seu óbvio ponto fraco. Os bancos terão mais aportes de capital do contribuinte e, exceto o ritual dos testes de estresse, não há nada muito diferente em relação à antiga administração. Os acionistas, controladores e administradores continuam sendo mais ou menos os mesmos. O Proer brasileiro impôs perdas aos controlares e gestores dos bancos falidos.

O repórter da Black Entertainment Television fez uma pergunta dando um tom grave à crise econômica e seus efeitos na população, especialmente na comunidade negra, e perguntou o que ele faria a respeito. Obama, na resposta, incluiu os latinos, admitiu que são comunidades que sofrem mais o impacto da crise e falou dos resultados que espera do seu plano de estímulo econômico.

Em todas as outras questões, seja o arsenal militar do Paquistão, aborto, reforma da lei de imigração (pergunta da Telemundo), Obama respondia diretamente. Não usava a pergunta como trampolim para discursos de campanha ou autolouvação. Que diferença!


Jogando conversa fora
Josias de Souza

Foto: Getty Images

Lula levando um "lero" com jornalistas no meio da rua, em frente a seção eleitoral onde votou para prefeito em São Bernardo do Campo

Fontes: Blog do Josias

No primeiro mandato, só de raro em raro Lula falava com os repórteres.

Reeleito, prometera amiudar as entrevistas. Cumpriu o compromisso.

Agora, fala mais do que o homem da cobra, como se diz.

Dispensou a pompa das grandes coletivas.Prefere a informalidade da entrevista picada.
São raras as aparições em que não diga meia dúzia de palavras.

Tornou-se íntimo dos gravadores, afeiçoou-se aos microfones. A tal ponto que já começa a jogar conversa fora.

Lula porta-se sob os holofotes como se estivesse numa mesa de bar.

Dias atrás, na saída de um velório, no Recife, veio com uma conversa mole. Pôs-se a desancar o aparato de fiscalização do Estado. Disse que a vigilância, por excessiva, atrapalha o andamento das obras.

Nesta quinta (30), repetiu o lero-lero, dessa vez no Rio. Afirmou que, submetido à sanha fiscalizatória, JK não teria feito Brasília.

Pois bem, neste 1º de Maio, Lula resolveu posicionar-se sobre a “farra aérea”.

Disse que há “hipocrisia” na forma como a imprensa aborda o tema. Chegou mesmo a sugerir a criação do "dia nacional da hipocrisia".

Foto: Agência Brasil

Saiu em defesa dos congressistas que se lambuzaram na cota de passagens. Admitiu que, na sua época de deputado, também cedeu bilhetes a terceiros.

"Eu, muitas vezes, convoquei dirigentes da CUT e de outras centrais para se reunirem, com passagens no meu gabinete".

“Sempre foi assim.

Não vejo onde está o tamanho do crime em levar a mulher ou o sindicalista para Brasília".

Na véspera, dissera algo semelhante: "Eu não sei porque vocês vendem como novidade o que acontece na Câmara...”

Qual é a novidade que vocês descobriram? Que um deputado utiliza passagem? Isso é utilizado desde que o Congresso é Congresso, gente".

Acha certo que parentes e amigos viagem nas asas da Viúva? "Não acho correto, mas não acho crime dar passagem para outra pessoa... ”

O problema do Brasil não é esse ...  Esse não é o mal do Brasil. Se o mal do Brasil fosse esse, o país não teria mal".

O “sempre foi assim”, imprudência verbal dos parlamentares que Lula incorporou ao seu discurso, serve de defesa aos malfeitores.

A expressão remete ao axioma segundo o qual os políticos são todos iguais.

“Farinha do mesmo saco”, na linguagem das ruas.

O raciocínio é irmão gêmeo do “todos os partidos fazem”, invocado por Lula quando o ex-PT foi pilhado no maravilhoso mundo do caixa dois.

"A imprensa está dando dimensão demais para uma coisa que pode ser corrigida pela Mesa”, disse Lula sobre a estripulia das passagens aéreas.

“Isso já está na imprensa há mais ou menos um mês. Temos coisas importantes para discutir e aprovar no Congresso Nacional".

Esquece-se de um detalhe: foi o desgaste do noticiário longevo que empurrou as Mesas da Câmara e do Senado para a mudança de procedimentos.

Do contrário, o país conviviria com um perpétuo “sempre foi assim”.

A construção da democracia supõe saber distinguir diferenças.

O Brasil não construirá a sua enquanto não deixar de acreditar que é tudo a mesma coisa.

O Lula de ontem enxergava no Legislativo um magote de “300 picaretas”. O Lula de hoje serve-se da picaretagem.

Joga a sorte do seu governo num modelo de Congresso em que fluem as trocas de favores, os privilégios, os empregos e as verbas.

Sempre foi assim, bolas.

Todo governo faz, caramba.

Se não deseja contribuir para eliminar o inaceitável, Lula talvez devesse calar.

Abordado pelos repórteres, pode recorrer ao que os ingleses chamam de “small talk”.

É a conversa fora de todos os dias.

“Chove, não? Faz um belo dia de Sol, não acha?
Corre o risco de ser apontado como vítima de paralisia mental.

Livra-se, porém, da pecha de tolo. Ou, pior: cúmplice de malfeitores.

Com alguma sorte, pode colher um elogio do Romário: “Calado, o Lula é um poeta”.





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