A conspiração de Mercadante, para queda de Mantega, provocou um imenso mal-estar no governo. Até agora, porém, a desastrada ousadia, só fez com que ele perdesse espaço e prestígio junto à irritada presidenta Dilma.
Na semana passada, VEJA revelou uma iniciativa insólita do ministro da Educação, Aloizio Mercadante: o petista propôs ao vice-presidente da República, Michel Temer, que convencesse a presidente Dilma Rousseff a demitir o ministro da Fazenda, Guido Mantega.
A natureza da conversa causou espanto. Primeiro, porque não é comum um ministro recorrer ao vice-presidente para tramar a queda de um colega — menos ainda quando esse colega comanda uma área sensível como a econômica.
Segundo, porque Dilma resiste desde o início de seu mandato a exonerar Mantega, blindando-o das críticas recorrentes de parlamentares aliados, empresários e sindicalistas.
Protagonista de uma conspiração clássica, Mercadante provocou um imenso mal-estar no governo. O ministro confirmou a reunião com Temer, mas se apressou em negar que esteja trabalhando pela demissão do companheiro. Já Mantega disse, protocolarmente não acreditar que estivesse na mira de Mercadante, seu amigo há mais de trinta anos. E Dilma fez saber que não gostou nem um pouco da intriga e se mostrou insatisfeita com o movimento de Mercadante, ironicamente um dos auxiliares que ela mais tem ouvido.
Conhecida a conspirata, restou a dúvida sobre a razão do empenho e da ousadia de Mercadante na queda de Mantega. A resposta é simples: diante da possibilidade de não ser nomeado para a Casa Civil, ele passou a trabalhar para assumir a Fazenda, mantendo aceso o bom e velho fogo amigo petista.
Com os programas do governo emperrados, o desempenho pífio da economia e a base aliada conflagrada no Congresso, auxiliares da presidente defendem a realização imediata de uma reforma ministerial como forma de recomeçar o governo.
Foto: Wilson Pedrosa/AE
Dilma resistente a mudanças, até quando ?
Dilma resiste à pressão. Ela alega que reduzir o número de ministérios, por exemplo, não resultará nem mesmo em economia significativa de despesas.
Com a sucessão de protestos nas ruas e a queda de popularidade pesquisa após pesquisa, a presidente, no entanto, encomendou à Casa Civil um esboço de reforma administrativa.
A iniciativa, se posta em prática, pode resultar no corte de ministérios e em mudanças em seus comandos. Foi essa discussão que mexeu com os brios do ministro da Educação. Uma das ideias em estudo prevê o remanejamento dos ministros Paulo Bernardo e Miriam Belchior.
Bernardo trocaria as Comunicações pelo Planejamento, onde dava expediente no governo Lula. Miriam passaria do Planejamento para a Casa Civil, justamente o cargo para o qual Mercadante despontava como favorito.
Diante dessa possibilidade, Mercadante decidiu apostar as fichas para derrubar Mantega e, assim, substituí-lo.
"Desde o governo Lula, a orientação sempre foi para que nenhum ministro, além do próprio titular da Fazenda, entrasse nos assuntos da área econômica. O Mercadante contraria isso o tempo todo", diz um auxiliar de Dilma.
Há vinte dias, a antessala do gabinete da presidente serviu de ambiente para uma dessas explanações conspiratórias de Mercadante. Alguns ministros aguardavam o início de uma reunião com Dilma sobre as consequências das manifestações populares no país.
Enquanto tomavam um cafezinho, trocavam ideias sobre como fazer Dilma recuperar sua popularidade. Mercadante estava lá e, segundo o relato de um dos presentes, vaticinou: é preciso resgatar a credibilidade da economia.
"Ele insistia que sem recuperar a credibilidade da economia o governo não resolve seus problemas", contou a VEJA um dos ministros.
Semanas antes, numa reunião da qual participavam também os ministros Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, e Paulo Bernardo, Mercadante se dirigiu à própria Dilma: "Tem de resolver o problema da economia".
Não se sabe quando haverá uma reforma ministerial nem a extensão dela. Segundo um auxiliar da presidente, a prioridade neste momento é reorganizar a relação do governo com os parlamentares e os partidos — peças-chave na sucessão de 2014 — para só depois mexer na administração.
Foto: Wilson Pedrosa/AE
Mantega, o alvo preferencial de Mercadante, resiste
Neste momento de turbulência, a marola provocada por Mercadante atrapalha ainda mais a vida do Planalto e, de quebra, reduz as chances do petista de ascender na estrutura de poder. Dilma deu uma bronca em Mercadante, inclusive a pedido de outros ministros.
Recentemente, colocou-o na geladeira e passou a ouvir mais outros auxiliares, como Paulo Bernardo e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Mercadante agora tenta desfazer a armadilha que ele mesmo montou. Logo após a edição de VEJA chegar às bancas, o ministro conversou longamente por telefone com Temer. Convenceu-o a divulgar uma nota oficial curta em que nega a conspirata — e a repetir essa versão para Dilma.
Ex-líder do governo Lula, Mercadante tem um vasto repertório de trapalhadas no currículo. Em 2006, aliados dele estavam entre os aloprados que forjaram um dossiê fajuto contra o tucano José Serra. Na campanha presidencial de 1989, o ministro defendia a proposta de calote à dívida externa. Em 1994, quando era vice na chapa de Lula, tachou de "eleitoreiro" o Plano Real, apostando publicamente em seu fracasso — erros técnicos e políticos colossais.
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