4 de set. de 2012

José Múcio, um malabarista na corte

BRASIL
José Múcio, um malabarista na corte
Por pressão de empreiteiras e de um sobrinho, um ministro do TCU muda seu voto e abandona um julgamento de R$ 7 bilhões sem explicar

Foto: Paullo Allmeida/Folha de Pernambuco

EM FAMÍLIA - O ministro José Múcio (com o copo na mão) e o sobrinho Fernando Monteiro (a sua direita) numa festa. Um dos consórcios interessados na decisão do tio procurou o sobrinho

Postado por Toinho de Passira
Texto de Murilo Ramos
Fonte: Revista Época

O pernambucano José Múcio Monteiro, um dos mais serelepes políticos de Brasília, anda caladão. Deputado federal por quatro mandatos e ministro de Lula, Múcio está há quase três anos no Tribunal de Contas da União (TCU). Virou ministro da corte por obra do padrinho Lula, com quem falava muito – as indicações para esse Tribunal técnico são, em sua maioria, estritamente políticas.

No mundo do poder, o TCU faz fama como um cantinho do céu dos políticos, uma aposentadoria de luxo com que um governante premia os mais leais e cansados aliados. Na quarta-feira da semana passada, no mais importante julgamento do TCU neste ano, quando a corte mais precisava dele, Múcio permaneceu mudo. Declarou-se impedido por questões pessoais. Talvez porque Fernando Monteiro, seu sobrinho, fizera lobby no caso.

No julgamento, o TCU finalmente autorizou o governo a fechar contrato com o Consórcio Rodovia da Vitória, que administrará a Rodovia BR-101, entre Espírito Santo e Bahia, por 25 anos. Havia dúvidas sobre a capacidade técnica do consórcio. Trata-se da primeira concessão do governo da presidente Dilma Rousseff, com investimentos previstos de R$ 7 bilhões – um negócio que tem agitado Brasília e que deu muito trabalho aos ministros do TCU.

O segundo colocado no leilão, o Consórcio Capixaba, recorrera da decisão, e o processo caiu no colo de Múcio. Em abril, ele concordara com a empresa derrotada e suspendera a assinatura do contrato. Duas semanas depois, mudou de ideia e liberou o contrato. De tão estranho, o malabarismo de Múcio levou Lucas Furtado, procurador do Ministério Público no TCU, a acusar o ministro de “sofrer pressões” para mudar o voto. Cinco dias depois da acusação, Múcio se declarou impedido. E não disse mais palavra.

Por que Múcio mudou seu voto? E por que se declarou impedido? ÉPOCA perguntou isso a ele, por telefone, antes do julgamento. Transcorreu o seguinte diálogo:

– Por que o senhor se declarou impedido?

– É para publicar? Eu não queria… É que eu me senti incomodado, com muita gente pedindo de um lado, pedindo do outro, pedindo de um lado, pedindo do outro… Eu me senti incomodado com as pressões.

– O senhor não vai dizer quem lhe pressionou?

– Claro que não. É uma questão pessoal. Tenho minhas conveniências.

Após o julgamento, a reportagem procurou Múcio em seu gabinete. Nele, há uma caricatura de Múcio como malabarista. Confrontado com a informação de que o sobrinho Fernando Monteiro atuara como lobista do Consórcio Capixaba, Múcio ficou lívido.

“Fernando disse para mim que eu deveria ter cuidado na condução do processo da BR-101. Disse que foi procurado por pessoas de um consórcio e que queriam um encontro comigo”, afirmou Múcio. “Isso também interferiu para eu me afastar do caso.”

A ÉPOCA, Fernando disse apenas: “Fui procurado por pessoas que me pediram para marcar um encontro com o ministro José Múcio. Respondi que não e que ele (ministro) não aceitaria”. A exemplo do tio, Fernando é meio calado. Não informou ser dono de um escritório de consultoria política, a Fendy Assessoria, no centro de Brasília. A exemplo do tio, Fernando tem suas conveniências.


* ”Malabarismo na corte” é o título original do texto

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