28 de ago. de 2009

Edward Kennedy: O príncipe, o leão e a leoa

Edward Kennedy
O príncipe, o leão e a leoa

Foto: AFP

Ted Kennedy, 22 de fevereiro de 1962, em visita ao Senado Alemão

Lucas Mendes
Fontes: BBC Brasil

Dos quatro irmãos Kennedy, Ted , o príncipe da dinastia e o leão do Senado, foi campeão em política, alcoolismo e promiscuidade. Incorruptível na vida pública, tresloucado na privada.

Por causa de uma mulher, Mary Jo Kopechne, ele não chegou a Presidência. Levou Joan, mãe dos seus filhos, ao alcoolismo, mas, aos 60 anos, foi salvo e domado pela leoa Vicky.

As loucuras do caçula do mais famoso clã político dos Estados Unidos apareceram cedo. Ele passou por dez escolas primárias americanas e inglesas antes dos 11 anos. A família vivia em trânsito. Quando, gracas ao nome, entrou em Harvard, durou pouco.

Pediu a um colega para fazer a prova dele de espanhol. Foi pego e expulso da universidade.

Era tempo de guerra na Coreia e o serviço militar americano, obrigatório. Ted se alistou no Exército. Graças à influência do pai, foi servir e rosetar em Paris, no QG da OTAN. Dois anos de farda, vinho, mulheres e música.

Na volta deu uma guinada. Se rematriculou em Harvard, fez Direito na universidade de Virgínia, bom aluno, brilhou em debates.

Impossível dizer o que teria feito Ted Kennedy se os três irmãos mais velhos não tivessem morrido. O mais velho, Joe, favorito do pai, morreu num bombardeio na Segunda Guerra. As vidas políticas de John e Bob foram curtas e só podem ser medidas em possibilidades, mas a de Ted Kennedy tem um currículo de 46 anos.

Quando John Kennedy foi candidato à Presidência deram a Ted um papel menor, mas ele se entregou de corpo e alma, viciou e só dois políticos serviram mais tempo do que ele no Senado americano. Passou por dez presidentes e nenhum deles deixou mais impressões digitais nas mudanças do país do que o senador Ted Kennedy. Todas as leis sociais desde o fim da década de 60 tem as marcas dele. São mais de 2.500.

No senado rugia , na vida pessoal prevaricava.

Foto: UPI

O senador Edward Kennedy com a sua primeira esposa Joan kennedy conversam com o Secretario Geral do Partido Comunista Leonid Brezhnev, no Kremlin, Moscou 4/22/1974

Joan, a primeira mulher, não conseguiu conter os impulsos etílicos e mulherengos do marido nem se enquadrar no estilo dos Kennedys: queriam que vivesse em constante atividade esportiva, social e com uma gravidez em cima da outra, como Ethel, mulher de Bob Kennedy.

Joan teve vários abortos, mas o alcoolismo só tomou conta dela depois da tragédia de Chappaquiddick, quando o carro dirigido pelo marido caiu de uma ponte. Ted Kennedy sobreviveu e desapareceu por dez horas. A companheira, Mary Jo Kopechne (foto), ex-assessora do irmão Bob, morreu afogada, e, com ela, as possibilidades presidenciais de Ted Kennedy.

Durante anos de cobertura política vi o senador em ação várias vezes nas convenções do partido e outros eventos, mas meu primeiro contato foi no escritório dele no Senado, em 69, pouco antes da tragédia, quando recebeu nosso pequeno grupo de bolsistas .

O mais bonito dos irmãos, um touro de forte, com vozeirão de locutor, sorriso frouxo e debochado. Política externa não era o forte dele. Sabia pouco sobre o Brasil, mas descobriria alguns dos nossos encantos em farras na Flórida com gente das melhores famílias brasileiras.

Foi ativo contra a ditadura no Chile, o Apartheid na África do Sul e a guerra do Vietnã, mas seu principal cenário de ação era o doméstico.

Prevaricador na vida pessoal, modelo de legislador no Senado. Noventa e nove dos cem senadores disseram que ele era o mais eficiente dos legisladores. Sabia o que falava, tinha o melhor staff, transitava entre republicanos e democratas, mas quase destruiu sua carreira noutro porre em Palm Beach, com o filho e o sobrinho William Kennedy Smith. Os jornais descreveram o senador correndo bêbado de cuecas pela praia. O sobrinho foi acusado de estupro e absolvido no julgamento, coberto ao vivo pelas redes de TV. A carreira do senador encolheu, mas resistiu.

Foto: Stephen Crowley/The New York Times

O Senador Edward Kennedy e sua esposa, Victoria Kennedy, chegam ao Capitólio. , acompanhados por cães portugueses, (Cão de Água do Algarve), raça cultivados pa família desde os tempos de seu pai, Joseph Kennedy

No ano seguinte, reencontrou Vicky, mas não se lembrava dela quando trabalhou como estagiária dele, ainda universitária, no escritório no Senado. Era filha de velhos amigos da Louisiana. Aos 60 anos, o senador se apaixonou. Ligava duas vezes por dia , levava Vicky para concertos no Centro Kennedy de Artes, pintou quadros à óleo para ela e finalmente propôs casamento depois da ópera La Boheme.

Vicky entrou na jaula do leão e botou a maioria indesejável para fora. Os filhos mal educados do senador receberam lições de boas maneiras, amigos que davam bebida para o marido foram afastados. O senador parou de beber.


O Leão e a Leoa na campanha de Obama

Advogada de prestígio, fundadora e presidente de ONGs nas áreas de criança, educação e armas, Vicky hoje é sondada para assumir o lugar de Ted Kennedy no Senado, mas há impedimentos legais, ironicamente criados pelo próprio partido democrata de Massachussets. Ela diz que não está interessada.

Ted Kennedy dizia que seu melhor voto no senado foi contra a invasão do Iraque, mas a principal causa política dele foi a reforma na Saúde. Queria um sistema público, no estilo europeu, semelhante ao proposto por Obama e furiosamente combatido pela direita, seguradoras, médicos e hospitais.

Pelas conjuminâncias que rolam no Senado, é possível que a causa seja decidida por um voto, e o senador - nem a mulher - estará lá para decidir a parada.


* Acrescentamos as fotos e as legendas ao texto publicado originalmente na BBC Brasil

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