21 de jun. de 2013

Indústria do gás lacrimogêneo lucra e cresce alimentada por protestos em todo o mundo

BRASIL - Manifestações
Indústria do gás lacrimogêneo lucra e cresce alimentada por protestos em todo o mundo
Críticos dizem que gás não pode ser chamado de não letal, mas é a primeira opção das tropas de choque de todo mundo. Um poderosa empresa brasileira fabricante do produto tem como clientes 41 países e deve estar fazendo hora extra para atender o mercado interno. Destaque-se que especialistas dizem que vinagre não é antidoto, nem alívio para gás lacrimogêneo e até pode potencializar os efeitos.

Foto: Yannis Behrakis/Reuters

Gás brasileiro espanta manifestantes na Praça Taksim, na Turquia

Postado por Toinho de Passira
Fontes: BBC Brasil, Condor Non-Lethal Technologies , Repórter Brasil, G1

Em meio à crise econômica e às várias medidas de austeridade adotadas e insatisfação popular ao redor do mundo, um setor da indústria está se dando bem: os fabricantes de gás lacrimogêneo. Uma empresa brasileira a Condor Non-Lethal Technologies é uma das líderes mundiais de fornecimento do produto, presente nas mãos dos policiais e nos olhos de manifestantes de pelo menos 41 países.

Desde a Primavera Árabe (iniciada no final de 2010), o mercado de segurança interna no Oriente Médio teve um aumento de 18% em seu valor, chegando próximo aos 6 bilhões de euros (R$ 17,4 bilhões) em 2012, diz a BBC Brasil.

Usado por forças de segurança do mundo inteiro para dispersar manifestações, as bombas de gás lacrimogêneo também tiveram destaque recente nas imagens da evacuação do Parque Gezi em Istambul no último fim de semana e da repressão aos protestos em diversas cidades brasileiras no movimento conhecido como a Passeata dos 20 centavos, contra o aumento das tarifas de transporte público, a corrupção política, os gastos excessivos na organização da Copa do Mundo 2014, a precariedade do transporte público, do ensino, da saúde e da segurança.

Egito e Tunísia estão aumentando suas compras de equipamentos para controle de distúrbios no momento em que negociam empréstimos com o FMI para cobrir seus buracos orçamentários.

Na zona do euro, afetada pela crise financeira, as coisas não são muito diferentes. O orçamento de 2012 do governo espanhol de Mariano Rajoy enfrenta cortes em praticamente todas as áreas, mas em equipamentos antidistúrbios o gasto passa de cerca de 173 mil euros a mais de 3 milhões em 2013.

Durante a Primavera Árabe, empresas americanas exportaram 21 toneladas de munição, o equivalente a cerca de 40 mil unidades de gás lacrimogêneo.

Foto: Marcelo Ninio/Folhapress

Menino sírio segura bomba de gás lacrimogêneo "made in Brazil", num campo de refugiados

Em termos de manejo de protestos, nada mudou com a democratização egípcia. Esse ano, o ministério Interior encomendou cerca de 140 mil cartuchos de gás lacrimogêneo ao mesmo elenco de exportadoras americanas.

Em fevereiro, o porta-voz do Departamento do Estado americano, Patrick Ventrell, defendeu a concessão de licenças para a exportação a essas empresas, dizendo que o gás lacrimogêneo "salva vidas e protege a propriedade".

A empresa brasileira Condor Non-Lethal Technologies usa argumentos semelhantes.

"As tecnologias não letais são projetadas para incapacitar temporariamente as pessoas sem causar danos irreparáveis ou morte. Seus efeitos são totalmente reversíveis. De acordo com uma recomendação da ONU em 1990, a polícia tem de fazer um uso proporcional da força por meio de armas não letais em consonância com os direitos humanos e o respeito à vida", disse um porta-voz da Condor Non-Lethal Technologies .

A expressão "não letal" aparece no nome e marca de muitas companhias. Mas o uso dessa expressão é contestado por especialistas e grupos defensores de direitos humanos, que também questionam a relação próxima entre a indústria, as forças militares e de segurança e governos, que permitiu que o uso do produto fosse se consolidando como arma repressiva favorita ao longo das últimas décadas.

Polícia de São Paulo usou bomba de gás com data de validade vencida. Especialistas dizem que os efeitos do gás pode ser mais perniciosos.
Foto: Anali Dupré/Repórter Brasil
Na Primeira Guerra Mundial, o gás lacrimogêneo era classificado como arma química. Mas a partir daí, entrou um cena a força do lobby industrial-militar-governamental, explica a pesquisadora Anna Feigenbaum, que investiga a história política do gás lacrimogêneo na Universidade de Bournemouth, na Grã-Bretanha.

"Por pressão dos governos e das corporações, mudou-se o nome de 'arma química' a 'irritante químico' ou 'instrumento de controle de distúrbios'. Isso produziu uma normalização. O gás que começou a ser usado no 'controle de multidões' na década de 30 se generalizou a partir dos anos 60", disse.

Uma pesquisa pedida pelo governo britânico sobre o uso de gás lacrimogêneo no fim dos anos 1960 na Irlanda do Norte contribuiu de forma particularmente significativa para essa normalização.

A investigação concluiu que não havia perigo nem para mulheres grávidas, nem para idosos, uma afirmação duramente criticada pela Anistia Internacional e pela ONG Médicos pelos Direitos Humanos.

Ambas as organizações sustentam que não é preciso ser mais velho ou estar grávida para sentir efeitos "irreversíveis" dessas armas não letais. Entre as mortes mais recentes atribuídas ao uso de gás lacrimogêneo figuram a do adolescente Ali Al-Shiek Bahrain no ano passado e a do palestino Mustafa Tamini no final de 2011.

Foto: Caio Kenji/G1

A advogada Adriana Gragani levou para o ato uma garrafa de vinagre, esperançosa que o mito de que o condimento ajude a combater os efeitos do gás lacrimogênio.

Segundo o toxicologista, Flávio Zambrone de Campinas(SP), o gás lacrimogêneo que é um derivado de cloro causa reação ao entrar em contato com a água das mucosas, provocando queimaduras na pele, nariz e boca.

“Nos pulmões provoca um aperto no peito, como se fosse uma sensação de respirar dentro de um saco plástico.

”Para quem tem enfermidades cardíacas e respiratórias, inalar o gás pode provocar até a morte”, disse.

Outro reflexo são tosses, vômitos, queimaduras e glaucoma nos olhos.

Os efeitos levam entre 20 a 45 minutos para passar. Por esse motivo, a recomendação do toxicologista é de lavar o local em que o gás atingiu, buscar ar puro e manter a calma.

"O melhor conselho é se afastar de áreas que espalham o gás, pois os componentes ficam no ar e os riscos são grandes de queimaduras", alerta o toxicologista. Em casos mais críticos, a orientação é procurar o atendimento médico.

Dr. Flávio Zambrone, diz também que é um mito que vinagre ameniza os efeitos instantâneos do gás lacrimogêneo e neutraliza as queimaduras na pele provocada por ele. Pelo contrário diz o especialista, o uso do vinagre pode aumentar a irritação na pele e principalmente na região dos olhos.

“Apesar de haver relatos de que vinagre inalado ou aplicado na roupa dá uma sensação de alívio, ele não protege do gás” e pode agravar seus efeitos, conclui Zambrone.

Foto: Caio Kenji/G1

Óculos de natação, pode proteger dos efeitos do gás lacrimogêneo, por isso, o estudante de psicologia Yuri Moreira, 23, decidiu trazer os seus para o protesto


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