Joaquim Barbosa critica a indiferença da justiça, no caso do estudante morto no trote de medicina
BRASIL - Justiça Joaquim Barbosa critica a indiferença da justiça, no caso do estudante morto no trote de medicina ”A Justiça, e especialmente os chamados tribunais superiores, com as exceções de praxe, agem de forma gélida, a anos-luz das tragédias que lhes passam pelos olhos, limitando-se, até porque assim determina nossa legislação, a examinar papelada e a ouvir advogados, longe, muito longe da vida real que pulsa fora de seus gabinetes”. Foto: Arquivo famlia Postado por Toinho de Passira Já faz 14 anos que o jovem Edison Tsung Chih Hsueh, calouro do curso da melhor escola de Medicina do Brasil, abdicou à força de seus sonhos e, morrendo afogado na piscina da Associação Atlética da Faculdade de Medicina da USP, teve destroçada a felicidade de sua família por um absurdo e violento trote praticado por veteranos. Hoje, esses veteranos, devidamente identificados pela Polícia, são médicos prósperos e respeitáveis. Ninguém mais se lembra de seus nomes. O inquérito policial que os identificou transformou-se num processo-crime e quatro dos rapazes escaparam de condenação pelo tribunal do júri porque advogadões conseguiram trancar a ação penal. O Ministério Público recorreu. O processo engatinhou na Justiça como se Edison, o rapaz promissor que morreu porque não sabia nadar e não foi socorrido por ninguém, fosse um inseto — uma barata, um pernilongo, um mosquito esmagado. O processo rolou por todas as instâncias da Justiça até ir parar, pelos absurdos do sistema legal no Brasil, no Supremo Tribunal Federal, quando poderíamos e deveríamos ter uma legislação que tornasse viáveis decisões finais sem necessidade de o caso “subir” à corte mais alta do país.
E, lá, o Supremo acabou convalidando uma decisão tomada no longínquo ano de 2006 pelo Superior Tribunal de Justiça — vejam as demoras de um caso tão grave –, no sentido de mandar arquivar o processo. Ponto final. Dane-se a família de Edison, dane-se o futuro que o rapaz nunca teve. A votação no Supremo não foi apertada nem folgada — 5 votos pelo arquivamento, 3 contrários. E aí o presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, resolveu manifestar sua revolta: – Estamos aqui chancelando a impossibilidade de punição aos que cometeram um crime bárbaro. Quero dizer que o Supremo Tribunal Federal está impedindo que essa triste história seja esclarecida. O ministro opinou que o Supremo “violou a soberania” do júri e, por causa disso, “violou abertamente” a Constituição. E perguntou: “A quem (senão ao júri) incumbiria examinar se eles são ou não culpados? O tribunal do júri — ou um órgão burocrático da Justiça brasileira situado em Brasília, o Superior Tribunal de Justiça?” O ministro ficou tocado pelo fato de que toda a discussão do caso da morte do jovem estudante de Medicina tivesse ficado focada em questões técnicas — em nenhum momento entrou-se no núcleo da questão, no mérito da causa em exame, o virtual assassinato do estudante. E aí o ministro disse o que provavelmente inúmeros brasileiros gostariam de dizer aos demais ministros, aos ministros do STJ e aos magistrados de outras instâncias em que cabe a carapuça: – O tribunal se debruça sobre teorias, sobre hipóteses, e esquece aquilo que é ESSENCIAL: a vítima. Não se fala da vítima, não se fala da família! Sabemos todos que o ministro Joaquim Barbosa é explosivo e, não raro, fala mais do que deve, em tom acima do razoável. Mas, nesse caso, não poderia estar mais certo. Eu, como profissional, já vi funcionar a Justiça em países tão diferentes como o Reino Unido, o Chile, os Estados Unidos — e, de formas diferentes, os magistrados se envolvem mais nos processos, passam pitos em réus, se comovem com o conteúdo dos processos, agem no mais das vezes com um visível interesse nas pessoas que estão em causa. Aqui, não. A Justiça, e especialmente os chamados tribunais superiores, com as exceções de praxe, agem de forma gélida, a anos-luz das tragédias que lhes passam pelos olhos, limitando-se, até porque assim determina nossa legislação, a examinar papelada e a ouvir advogados, longe, muito longe da vida real que pulsa fora de seus gabinetes. As críticas do ministro Joaquim Barbosa a essa postura dos tribunais só o engrandece. |
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