BRASIL - CORRUPÇÃO Senador Demóstenes Torres não convenceu "A partir de 29 de fevereiro deste ano, hoje estamos inteirando três meses do episódio, passei a enfrentar algo que nunca tinha enfrentado na minha vida: depressão, remédios para dormir e que não fazem efeito, fuga dos amigos e talvez a campanha sistemática mais orquestrada da história do Brasil", disse o senador Demóstenes no seu depoimento no Conselho de Ética do Senado, onde responde a processo disciplinar acusado de envolvimento com a quadrilha do contraventor Carlinhos Cachoeira Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
DEMÓSTENES: "Sou um homem que tem vergonha na cara." Postado por Toinho de Passira Fontes: G1 , Veja, Reuters, Folha de São Paulo
Após três meses de silêncio, o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) negou, durante mais de cinco horas, no Conselho de Ética do Senado, onde responde a processo disciplinar, sob acusação de ter utilizado o mandato para auxiliar os negócios de Cachoeira, preso em fevereiro sob a acusação de comandar uma quadrilha de jogo ilegal, que tivesse participação nos negócios do bicheiro.
Fez uma defesa serena, inteligente, apelando para o sentimentalismo dos senadores e ressaltando seu trabalho no Senado. Disse estar sofrendo de depressão e que se encontrou novamente com Deus.
Embora usasse de toda a habilidade e inteligência que lhe são peculiares, não conseguiu rebater com propriedade de todas as acusações que pesam sobre ele. Talvez na justiça, consiga anular a maioria das provas, que foram obtidas de maneira legal, mas no Conselho de Ética, onde será julgado politicamente, com os pares votando a descoberto, não há chances de salvar a própria cabeça.
Em seguida dificilmente, o plenário do Senado, mesmo já tendo absolvido Renan Calheiros, no passado, embora protegidos pelo voto secreto, não vai ter coragem ou vontade de poupar Demóstenes.
Em discurso e após ser interrogado pelos senadores, ele voltou a afirmar que é amigo de Cachoeira, admitiu que o contraventor pagava sua conta de celular nextel, mas negou que tivesse conhecimento de irregularidades cometidas pelo bicheiro.
Ele também citou sua atuação parlamentar e os projetos importantes que ajudou a aprovar, numa tentativa de resgatar a imagem positiva que construiu paralelamente às ligações com a quadrilha. E negou ter usado o mandato a favor de Cachoeira e disse não ser crime informar o contraventor do andamento de um projeto de lei sobre a legalização de jogos de azar. “Que lobista sou eu que nunca procurei nenhum colega senador para aprovar jogo, qualquer que seja o partido?”, questionou.
O senador também afastou a possibilidade de ter ligações com a empreiteira Delta e de conhecer o ex-presidente da construtora, Fernando Cavendish.
“Como posso ser sócio de alguém que não conheço? Não posso ser responsável pelo que os outros dizem de mim”, reclamou o senador. “Tudo foi feito com o intuito de me destruir. Sócio oculto da Delta não sou eu. Se tem sócio oculto da empresa Delta procurem com uma lupa maior aí que não sou eu”, disse. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
DEMÓOSTENES: "Só pude chegar aqui hoje porque quero dizer para os senhores que redescobri Deus." MILHÃO - o senador disse ser improcedente a afirmação de que recebia 30% do que era arrecadado pela quadrilha com a exploração de caça-níqueis. Para sustentar sua versão, leu trechos dos autos que poderiam isentá-lo dessa acusação e entregou ao Conselho de Ética extratos de duas de suas contas bancárias. “Podem quebrar (o sigilo) a qualquer momento. Em nenhum momento foi depositado 1 milhão nas minhas contas. É preciso dizer que nem 1 milhão, nem 1 000 reais, nem 3 milhões”, declarou ele. "Todas as autoridades que atuaram nesse inquérito disseram textualmente que eu não tenho nada a ver com o jogo", afirmou.
Nextel - O senador também disse que recebeu o rádio modelo Nextel do bicheiro Carlinhos Cachoeira e o utilizou por “comodidade”. Negou, porém, ter conhecimento de que as conversas supostamente não poderiam ser grampeadas. "Hoje é fácil verificar que foi um erro. Não podia imaginar jamais que 40 ou mais pessoas tinham esses rádios”, afirmou.
AERONAVE - O parlamentar também confirmou ter usado aeronaves de empresários – a cessão de ao menos uma delas foi intermediada por Carlinhos Cachoeira. "Avião de empresários e amigos, utilizei. Vários", afirmou. "Não utilizei isso em troca do meu mandato parlamentar". Demóstenes afirmou, ainda, que nenhum dos aviões pertencia a Cachoeira.
MINISTROS - O senador também tratou do encontro que manteve em Berlim com o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes. Segundo o parlamentar, eles tinham destinos diferentes na Europa e se encontraram na cidade alemã por alguns dias. O retorno teria ocorrido em voos separados. Demóstenes também afirmou ter tido encontros com os ministros Luiz Fux e Antonio Dias Toffoli, mas por razões prosaicas e que nada têm a ver com as atividades do Congresso e do Supremo.
PEREGRINAÇÃO - Em seu depoimento, Demóstenes Torres também afirmou ter intermediado interesses da Vitaplan, empresa do bicheiro Carlinhos Cachoeira, junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Atuei em favor de todas as empresas do estado de Goiás. A Vitapan me procurou e era de propriedade do Carlos Cachoeira. Fui lá”, relatou. Ele disse ter feito uma espécie de peregrinação a gabinetes de ministros e de empresas para defender interesses do estado de Goiás. Em nenhum caso, disse ele, tratou de “interesses escusos”.
AÉCIO - O senador reconheceu ter pedido ao colega Aécio Neves (PSDB-MG) a nomeação de uma prima de Carlinhos Cachoeira no governo mineiro. Mas se exime: "Como eu disse, eu não tinha naquele momento a dimensão do que estava acontecendo. Mas pedi o emprego, para uma vaga que era do DEM, de uma pessoa extremamente qualificada".
FUNCIONÁRIA - O parlamentar admitiu que manteve uma funcionária na cidade de Anápolis, onde não mantinha escritório parlamentar, mas disse que demitiu a servidora assim que ficou claro que a contratação feria as normas do Senado.
CASSAÇÃO - O PSOL protocolou em março representação contra Demóstenes no Conselho de Ética logo depois de o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, ter pedido abertura de inquérito contra o parlamentar no Supremo Tribunal Federal (STF). Demóstenes pode perder o mandato por quebra de decoro parlamentar em votação secreta no plenário do Senado. Para o relator do processo no Conselho de Ética, Humberto Costa (PT-PE), ele mentiu ao negar relações com o contraventor Carlinhos Cachoeira.
Autor do requerimento que pede a cassação do político goiano, o PSOL diz que Demóstenes recebeu vantagens indevidas de Cachoeira. Conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal revelam, por exemplo, que o senador pediu dinheiro ao contraventor para arcar com despesas de um táxi aéreo e que atuava, como parlamentar, para defender os interesses do bicheiro.
TRAIÇÃO - Indagado pelo relator do processo, senador Humberto Costa (PT-PE), se sentia-se traído pelo bicheiro, Demóstenes afirmou: “Acho que todo mundo [se sente traído]. Todo mundo que se relacionou com ele e não tinha conhecimento [das atividades ilegais]. Todos nós ficamos na pior situação.”
“O que eu sabia era que me relacionava com um empresário que se relacionava com cinco governadores, e outras dezenas de políticos e empresários. Sim, ele tinha vida social, sim [...] Reafirmo que tinha amizade com ele, sim”, disse.
Costa perguntou se a amizade era "íntima" e Demóstenes respondeu: "De certa forma, sim". Durante sua fala, o senador voltou a confirmar que recebeu presentes do bicheiro.
DEDO DURO - Depois, ao fazer questionamentos, o senador Randolfe Rodrigues perguntou quem eram os cinco governadores citados. Demóstenes respondeu dizendo que os nomes estão na imprensa e que ele não vai fazer papel de "alcagueta".
GRAMPOS - O senador também tentou desqualificar as conversas telefônicas registradas pela Polícia Federal nas investigações sobre a quadrilha de Cachoeira. Segundo ele, algumas gravações foram “montadas”.
“Não [reconheço minha voz em todas as gravações], por isso pedi perícia. Tem muita coisa truncada, editada. Evidentemente que muitas conversas eu travei, agora, muitas conversas foram editadas e montadas”, afirmou.
Demóstenes disse ainda que os grampos são ilegais e deveriam ter sido autorizados pelo Supremo Tribunal Federal. Como é senador e tem foro privilegiado, ele argumenta que a Polícia Federal não poderia ter registrado as conversas sem antes pedir permissão ao STF.
“Tenho condições de enfrentar todas as acusações no mérito. Agora, o fato é que a investigação é ilegal e coloca em risco a democracia no Brasil”, afirmou. Segundo ele, o país corre o risco de se tornar uma “República comandada por procuradores e delegados”.
“Se o Supremo entender que o a investigação pode ser feita pelo primeiro grau e não pelo Supremo, vamos viver numa República comandada por delegados e procuradores do Ministério Público”, disse.
REVELAÇÃO - Ainda em sua fala, Demóstenes disse que, em 2011, Cachoeira revelou para ele e para Marconi Perillo, governador de Goiás, que tinha largado a contravenção e se tornado um "empresário dentro da legalidade".
No depoimento, Demóstenes disse que "jogou verde" com Cachoeira uma vez dizendo que havia uma operação da Policia Federal para investigar jogos ilegais. O senador afirmou que fazia "testes" para detectar se Cachoeira ainda mantinha atividades ilegais. "Evidentemente que o único propósito era para saber se ele ainda estava no jogo", justificou, mas não convenceu.
PREVARICAÇÃO - O senador Demóstenes afirmou ainda que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, "prevaricou" ao suspender, em 2009, as investigações da Operação Vegas, que apurou esquema de jogo ilegal supostamente comandado pelo contraventor.
"Ele [Gurgel] pervaricou [faltou com o dever]. Prevaricação para satisfazer sentimento ou interesse pessoal. Pode ser que não se prove o sentimento pessoal, mas em relação a improbidade administrativa, mais dia menos dias, o procurador vai ter de responder por isso", afirmou Demóstenes Torres.
As investigações, na época, já apontavam a ligação de Cachoeira com o senador Demóstenes Torres e com os deputados federais João Sandes Júnior (PP-GO) e Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO). Em resposta enviada a CPI Mista que investiga as relações do bicheiro com o políticos e empresários, o procurador disse que se não tivesse tomado a decisão de impedir a abertura do inquérito, não teria sido desvendado o esquema criminoso.
Na explicação que encaminhou à CPI Mista, Gurgel afirmou que os "elementos colhidos na operação Monte Carlo", posterior à Vegas, que resultou na prisão de Cachoeira, são uma "demonstração inequívoca do acerto da decisão de sobrestamento [suspensão]" da Vegas. Demóstenes criticou o procurador por não "fazer nada".
"Não arquivou, não pediu diligência, não fez nada. E mais, os argumentos que ele [procurador] fez, para que as investigações sejam retomadas no futuro [...] A outra operação nem começou na Polícia Federal, começou no Ministério Público de Goiás", disse o encurralado Demóstenes. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
O senador Demóstenes Torres e seu advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, durante o depoimento no Conselho de Ética do Senado |
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