Carros de sobra - Miriam Leitão
OPINIÃO Carros de sobra ”Todas as montadores do mundo chegarão ao final do ano com capacidade de produção de 103 milhões de veículos. Mas o consumo projetado é de apenas 79 milhões.” Foto: Arquivo Míriam Leitão e Alvaro Gribel Há carros sobrando no mundo. A indústria automobilística mundial está ociosa em 20 milhões de veículos. Esse é o número de carros que podem ser produzidos mas não há compradores. O número é cinco vezes o mercado brasileiro, que consumiu, em 2011, 3,7 milhões de automóveis leves. A produção no país subiu 0,7%; as exportações cresceram 7,5%; e as importações dispararam 29,8% no ano passado. A projeção da PricewaterhouseCoopers (PWC) para este ano é que a ociosidade vai aumentar de 20 milhões para 24 milhões. Todas as montadores do mundo chegarão ao final do ano com capacidade de produção de 103 milhões de veículos. Mas o consumo projetado é de apenas 79 milhões. Por isso a venda de importados vem subindo tanto. Um em cada quatro carros vendidos no Brasil em 2011 foi fabricado fora do país. O importante a se lembrar sempre é que 85% das importações foram feitas pelas próprias montadoras: 650 mil veículos. Outros 200 mil entraram via importadoras, que trouxeram carros da China, Japão e Coreia do Sul, principalmente. O pano de fundo para se analisar a indústria brasileira é a ociosidade de produção mundial, provocada pela crise econômica americana e europeia. O mercado está se deslocando para os países emergentes, tanto em termos de produção quanto de consumo disse o sóciodiretor da PWC, Paulo Petroni, que fez um estudo sobre o setor. A alta de um ano para o outro via importadoras chegou a 87%. A venda de carros chineses cresceu 346%, e a de japoneses, 108%, mas a base de comparação era baixa. A maior parte veio da Argentina e do México, países com os quais o Brasil possui acordos comerciais. Metade dos importados veio da Argentina. A importação feita pelas montadoras é reflexo da crise que houve na Argentina. Anos atrás, o país ficou com uma ociosidade de produção muito grande e foi mais fácil para as montadores transferir para lá parte da produção do que investir em novas plantas no Brasil explicou Flávio Meneghetti, presidente da Fenabrave. A participação dos veículos importados no mercado interno brasileiro saltou de 5,1%, em 2005, para 24% em 2011, segundo a PWC. No mesmo período, as exportações caíram de 30,7% para 15,9% do total da produção. A produção nacional cresceu 0,7% no ano passado e as vendas subiram 3,3%. Para este ano, a Anfavea prevê que a produção vai crescer 2%, mas as exportações devem cair 5,5% por causa da retração do consumo mundial. O excedente de produção em nosso setor provoca uma crescente dificuldade de competição. E há falta de competitividade não só da indústria automotiva mas da própria economia brasileira diz Ademar Cantero, diretor de Relações Institucionais da Anfavea. Mais do que a valorização do real, Ademar culpa os problemas de sempre para justificar a crescente dificuldade de exportar e competir com os importados: impostos elevados; mão de obra mais cara que a de outros países; infraestrutura ineficiente; energia cara; burocracia. Acha que as medidas do governo para o setor foram importantes, mas que não resolvem problemas que são estruturais. Foi uma medida pontual e inicial enquanto se desenha o novo regime automotivo. Até 2020, as vendas de automóveis devem saltar de 3,7 milhões para 6,5 milhões. Se nada for feito, esse aumento de demanda será ocupado pelos importados disse. Pelas contas de Paulo Petroni, o custo de produção de um veículo médio no Brasil é 60% maior do que na China; 52% maior do que na Índia; e 33% maior do que no México: O custo da mão de obra no Brasil supera o da mexicana, apesar de o trabalhador brasileiro receber salário menor. Temos encargos, taxas e contribuições que incidem sobre as folhas de pagamento. O trabalhador brasileiro leva para casa por volta de 55% do custo total da mão de obra; o mexicano, por volta de 75%. O kWh de energia elétrica no Brasil custa 0,81; contra 0,09 na Argentina; 0,05 no México; e 0,58 na Europa. O aço brasileiro, segundo a PWC, tem preço historicamente 35% a 40% acima dos níveis internacionais. Ainda assim, não se pode dizer que o setor automobilístico brasileiro apresenta maus resultados. O setor de veículos e peças fechou o ano com queda de apenas 0,4% na bolsa brasileira. Resultado muito melhor do que o do Ibovespa, que fechou em queda de 18,4%. A indústria automobilística terminou o ano com 144.710 empregados nas montadoras, 6,3% a mais que o total de dezembro de 2010. As vendas de motos cresceram 7,58% no ano passado. A de ônibus disparou 21,73%, enquanto a de caminhões subiu 9,69%. A Fenabrave projeta uma alta de 5,76% nas vendas para 2012, incluindo automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus e motos. Somente para carros, a expectativa é de emplacar 3.579.699 unidades, com aumento de 4,5% sobre 2011. Para caminhões, é prevista alta de 9,6%. Para ônibus, 14,3%. E, para motos, 7,5%. O lobby da indústria brasileira sempre foi forte e alguns governos são mais sensíveis a essa pressão. O atual é tão sensível que há quem diga que o MDIC, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, deveria se chamar MIA, Ministério da Indústria Automobilística. Mas com o excesso de produção mundial, que de fato existe, e com o aumento de importação, que em parte elas mesmas fizeram, o setor se enche de argumento para pedir medidas excepcionais de proteção. Só que a maioria dos problemas dos quais reclama todos os outros setores enfrentam. O mais adequado seria melhorar as condições de competitividade para toda a indústria brasileira. *Acrescentamos subtítulo e foto ao texto original. |
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