Delegado do caso dos aloprados diz a amigos que a PF protegeu os mandantes do crime e que Lula tinha conhecimento da compra do dossiê
Postado por Toinho de Passira
Fonte: Veja - 09/07/
O verbete “aloprado” foi usado pela primeira vez pelo ex-presidente Lula para qualificar os petistas presos numa atrapalhada e fracassada operação destinada a prejudicar candidatos tucanos nas eleições de 2006. Incorporado ao dicionário da corrupção brasileira, o termo bem poderia ser aplicado hoje aos investigadores do caso. Informações que vêm agora à tona provam que eles se preocuparam em incriminar apenas os bagrinhos e deixaram escapar os peixes graúdos: aqueles que encomendaram e planejaram o crime.
Um personagem central dessa história é o delegado Edmilson Pereira Bruno. No dia 15 de setembro de 2006, ele foi escalado para fazer um flagrante em um hotel em frente ao Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Lá estavam Valdebran Padilha e Gedimar Passos, petistas que, de posse de 1,7 milhão de reais, negociavam com notórios pilantras de Cuiabá a compra de um dossiê fajuto contra os tucanos.
Os dois foram presos. No curso das investigações, Bruno disse ao Ministério Público que havia condições de aprofundar a investigação e prender também os chefes do esquema, mas que seu trabalho estava sendo obstruído pela cúpula da Polícia Federal. Desde então, o delegado vinha se mantendo calado. Há duas semanas, porém, ele almoçou com um grupo de colegas e fez importantes confidências sobre o caso. Eis as principais:
• Ao ser preso, Gedimar disse a Bruno que temia ser morto, já que sua missão era de conhecimento dos principais dirigentes do PT. Citou nominalmente o então candidato ao governo de São Paulo e hoje ministro, Aloizio Mercadante, e o ex-presidente Lula. Ao chegar à sede da PF, porém, Gedimar foi instruído pelo então diretor executivo do órgão, Severino Alexandre, a mudar o depoimento e omitir os nomes estrelados.
• Na PF, contrariando as regras e com a anuência dos policiais, Gedimar circulou sem algemas e falou ao celular. Deu pelo menos cinco telefonemas, durante os quais avisou aos superiores o que estava ocorrendo. Em seguida, foi ao banheiro, jogou o chip do telefone na privada e apagou a memória do aparelho. Jamais se soube quem eram seus interlocutores.
• Valdebran Padilha afirmou em um primeiro depoimento que os papéis que tinha em mãos eram apenas parte do dossiê que o grupo havia comprado dos pilantras de Cuiabá. O restante do material tinha 2000 páginas e nomes de mais de 200 políticos supostamente ligados à máfia que fraudava licitações na área da saúde. Ele estaria em um jatinho em Congonhas. Bruno afirma ter sido impedido de buscar o material por seus superiores — Severino Alexandre e o superintendente Geraldo Araújo. Se encontrada, a versão integral do dossiê poderia fornecer mais pistas sobre quem o havia encomendado. A exemplo de Gedimar, Valdebran também foi orientado a mudar o depoimento e omitir essa informação, disse o delegado Bruno.
• No dia da prisão de Gedimar e Valdebran, Bruno solicitou ao hotel em que foi feito o flagrante uma cópia do circuito interno de TV. A direção do hotel pediu uma requisição formal da PF. Geraldo Araújo, o superintendente do órgão, no entanto, protelou o encaminhamento do pedido o quanto pôde, diz Bruno. Só o fez depois que um jornal publicou reportagem denunciando a demora. Foi graças a essas imagens que Hamilton Lacerda, o petista mais importante na lista dos denunciados, foi preso dias depois.
• Na delegacia, logo após o flagrante, o superintendente Araújo recebeu uma ligação de Márcio Thomaz Bastos, então ministro da Justiça, que queria saber se o nome do presidente Lula havia sido citado pelos presos. Assim que desligou, Araújo disse a Bruno: “Olha o problema que você criou. Daqui para a frente, você deve agir como o macaco que não fala, não ouve e não vê”. Araújo ordenou ainda a Bruno que não divulgasse a foto do dinheiro apreendido com Gedimar e Valdebran.
Procurado por VEJA, Bruno afirmou que não daria mais declarações sobre o caso, já que isso só lhe havia causado problemas. Desde o dia do flagrante, o delegado foi alvo de três processos, dois deles para apurar o vazamento de informações sobre o inquérito e outro para averiguar eventual "comprometimento político” de sua parte. Na semana passada, a Justiça decidiu que o 1,7 milhão de reais apreendido ficará com a União, já que não foi reclamado por ninguém. É um raro caso de dinheiro sem dono — e de crime sem mandante. Mas este já não se pode dizer que seja tão raro assim.
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