OPINIÃO: Os sinos da igreja anunciaram a tempestade
OPINIÃO Os sinos da igreja anunciaram a tempestade A defesa civil brasileira ainda depende dos campanários para alertar a população como o registrado no poema de Manuel Bandeira, “Evocação ao Recife”, onde relembra que eram os sinos que anunciavam os incêndios no capital pernambucana no início do século passado
Foto: Adelmo de Medeiros/Blog Roteiros da Fé Catolica Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa Não me peçam para garantir em qual dos jornais li essa manchete. Acho que foi na Folha de São Paulo. Li jornais daqui, de Pernambuco, de São Paulo, todos que pude ler. Li as notícias postadas aqui, no Blog do Noblat. Assisti aos noticiários da TV, falei com amigos e parentes. Os sinos da igreja, que o padre em boa hora tocou para avisar seus paroquianos, anunciaram a tempestade, o que salvou muita gente em Barreiros, Pernambuco. Doze pessoas perderam a vida. São doze as famílias enlutadas, por isso é leviano dizer que teria sido pior, pois para essa dúzia de famílias, foi pior. Mas fatos são fatos e se não fosse o padre, homem atento ao aviso distribuído aos municípios poucas horas antes da tragédia que se aproximava, tudo teria sido pior. Os habitantes de Barreiros com certeza são muito gratos ao padre, o que é justo e bom. Mas depois de demonstrar sua gratidão ao pároco, deveriam demonstrar sua ira contra os governos que não têm, em 2010, um sistema moderno de alerta e prevenção de acidentes em áreas sujeitas a terem seus rios inundados; cidades onde as tempestades são anuais deveriam ter um sistema de alerta mais moderno que um sino! Na tarde do dia anterior às chuvas torrenciais, já se sabia que a madrugada seguinte seria tenebrosa. Mas como na Londres dos tempos elizabetanos, dependemos ainda de um homem que grite à noite. Está tudo bem!Ou de um padre com força suficiente para badalar um sino! Alagoas tem radar meteorológico para detectar o risco de chuva forte, mas não tem Defesa Civil; Pernambuco tem Defesa Civil mas não tem radares para prever tempestades. Agora, depois da porta arrombada, os governadores certamente comprarão radares e organizarão Defesas Civis impecáveis. Mas saberão manter o que for feito neste momento, ou daqui um tempinho tudo ficará como dantes no quartel desse abominável Abrantes? Uma cidade alagoana, com um nome encantador, foi varrida do mapa. Branquinha era seu nome. Não sobrou nada. Com Quebrangulo, onde nasceu Graciliano Ramos, e São José da Laje, forma as três cidades onde nesta época do ano chove muito, com conseqüências sérias. Nem sempre as águas vêm com a força deste ano, mas sempre vêm... Não deveriam surpreender ninguém... Fico tentando imaginar qual a sensação de perder tudo, menos a vida, numa situação dessas. O alívio de se ver vivo, e aos seus. O medo do amanhã. O pavor das doenças. O desespero ao saber que outros não tiveram a mesma felicidade: perderam o bem mais precioso, a vida. Penso nas mil coisas que me custariam muito perder: os retratos, as cartas, as lembranças de pessoas queridas, a roupinha que meu filho vestiu quando nasceu, os livros. De repente, o coração dá uma paradinha: e perder tudo? A geladeira, o fogão, a cama, as roupas, as panelas? E ficar literalmente sem nada, do teto aos sapatos? E olhar para os lados e ver lama, miséria, luto, choro, destruição? E olhar para o amanhã e não saber como será? Para que servem os impostos municipais, estaduais e federais? Onde está esse dinheiro? À mão, naturalmente, já que o presidente Lula, comovido com o que viu, depositou nas contas de Pernambuco e de Alagoas mais de 200 milhões para cada um. Se depositou, é porque tinha esse dinheiro em caixa. Se tinha, por que essa verba não foi usada para urbanizar e prevenir? Por que nós só agimos depois e nunca antes? Dizem que essa foi uma chuva histórica. A de 66 aqui no Rio também foi histórica. Aliás, quando a natureza vem zangada, é sempre um evento histórico... Outra tragédia histórica foi a de Santa Catarina, há uns dois anos, se não estou enganada. Agora leio que fortes chuvas castigam de novo o Vale do Itajaí. Já há estado de emergência em seis municípios, há centenas de desabrigados. O rio Itajaí-Açu estava ontem com 8m44. Segundo a Defesa Civil de Santa Catarina, a qualquer momento o rio pode transbordar. Fala-se que uma frente fria pode provocar temporais com granizo e vendavais. Teremos condições de atender ao Nordeste e ao Sul? No Brasil todo existem poucos sistemas de radares meteorológicos ou de alertas de risco. Os poucos sistemas que temos não atendem às necessidades de monitoramento e alerta de tempo, afirma a especialista Ana Maria Held, diretora do Instituto de Pesquisas Meteorológicas da Unesp de Bauru. São poucos os radares meteorológicos? Também? Mais um item que vem se juntar à lista do que temos (ou às vezes nem temos) em muito pouca quantidade: hospitais, creches, escolas, estradas e transportes baratos, seguros, decentes e de qualidade. Sem luxos. Nós não somos ricos. É pouca coisa. Com dez reis de mel coado se faz isso tudo. Precisa ter fé. E desistir de querer exibir o que não temos, de ser o que não somos. Mas o que por enquanto não pode faltar são padres dispostos e bons campanários. No Brasil do século XXI, isso ainda é fundamental! *Acrescentamos subtítulo, foto e legenda. **Veja Post abaixo |
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