Relatório diz que a Agência Brasileira de Informação, a nossa CIA, espionou jornalistas durante governo Lula
BRASIL - Liberdade de Imprensa Relatório diz que a Agência Brasileira de Informação, a nossa CIA, espionou jornalistas durante governo Lula Um ex-analista do Departamento de Contra-Inteligência do órgão revela que a agência foi usada para investigar repórteres e donos de empresas Foto: Bruno Magalhães/Nitro Postado por Toinho de Passira Um documento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que descreve detalhes de uma queda de braço travada entre um agente e seus superiores durante o governo Lula, tem valor histórico inestimável. Esse documento, hoje arquivado, é a evidência oficial mais forte até aqui de algo que agentes confidenciavam a jornalistas, mas não podiam provar: o governo Lula espionou a imprensa. O texto revela que houve uma "Operação Mídia", ação clandestina de espionagem de jornalistas e donos de empresas jornalísticas. O documento de seis páginas no qual o tenente-coronel André Soares revela a existência da operação ilegal. Soares trabalhava como analista de informações da agência havia dois anos. Estava lotado na área de contrainteligência, encarregada de vigiar suspeitos de ligação com grupos terroristas e de monitorar a ação de espiões estrangeiros em território brasileiro. Antes de chegar à Abin, tinha passado pelo Centro de Inteligência do Exército (CIE). No documento, o oficial relata que foi convocado à sala do chefe em um fim de expediente em 2004. Lá, recebeu a missão de procurar um determinado informante. Tudo o que o chefe lhe passou foi o codinome do informante, sua profissão, o lugar do encontro e, o mais importante, o título e o objetivo da missão: "Operação Mídia". O tenente-coronel Soares conta que foi chamado à sala do coordenador de contrainteligência da agência, coronel João Noronha Neto, no dia 18 de junho de 2004. Por ser um analista interno, ele estranhou a determinação para participar de uma operação de campo e resolveu pedir a ordem por escrito. As missões do serviço secreto são, por definição, confidenciais. Isso é totalmente diferente de serem clandestinas, ilegais e até criminosas. Desconfiado da ilegalidade da missão que acabara de receber verbalmente, Soares pediu que a ordem fosse formalizada. A negativa foi peremptória. A informalidade e o segredo se justificavam, corno Soares descobriu mais tarde, pelo fato de a "Operação Mídia" ser clandestina. Ele se sentiu manipulado e encaminhou uma denúncia aos seus superiores em que escreveu: "Tomei conhecimento que o referido informante é da denominada ‘Operação Mídia'. Esta operação, conforme documento do CCE (Coordenação de Contra-Espionagem), está em curso, em Brasília, com despesa para o DCI (Departamento de Contra-Inteligência), não incluída no Plano Nacional de Contra-Espionagem (PNCE)". Soares protocolou o documento no Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República. Dois dias depois ele foi confrontado com as consequências de sua denúncia: foi demitido da Abin. Passados quase dez anos do episódio. André Soares foi localizado por VEJA em Belo Horizonte. Ele se recusou a dar detalhes da história, mas confirmou o teor do documento. "A operação tinha como alvo a imprensa. Não tenho condições de afirmar em que proporções, mas a imprensa era o alvo", disse. Formado pela escola militar, o oficial tem um currículo extenso na área de inteligência. Ele fez carreira no Centro de inteligência do Exército, em Brasília, tornou-se oficial de inteligência no GSI e, em 2002, foi designado para a Abin. Em quase três anos de agência, foi instrutor no curso de formação de espiões e passou por cargos importantes no Departamento de Inteligência e no Departamento de Contra-Espionagem. André Soares conhece como poucos as entranhas do serviço secreto brasileiro, mas reluta em revelar detalhes do que viu ou ouviu na Abin: "Tenho documentos que provam que essa operação estava em curso em Brasília. Em vários documentos internos que devem estar arquivados na Abin eu detalho todos esses fatos". Soares foi "punido" por se comportar como um servidor público exemplar. Ao suspeitar da ilegalidade da missão recebida, deixou tudo registrado por escrito, dificultando, assim, que seus responsáveis fiquem impunes para sempre. Diz Soares: "Operações clandestinas não deixam rastros, muito menos documentos oficiais". Para reforçar sua indignação lavrada nos documentos, Soares conta que fez a mesma denúncia pessoalmente ao general Wellington Fonseca, adjunto do então ministro-chefe do GSI, Jorge Félix. Qual foi a reação do general? "Ele lamentou o episódio, mas, até onde eu sei, não tomou nenhuma providência." O Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, ao qual a Abin está subordinada, negou-se a dar informações sobre o caso. Limitou-se a afirmar em nota que "não se manifesta, publicamente, sobre o conteúdo de documentos da Agência Brasileira de Inteligência". A Abin igualmente se recusou a prestar esclarecimentos. Os documentos que comprovam a "Operação Mídia", porém, estão arquivados. Eles poderiam vir à luz em uma eventual investigação do Congresso sobre o que parece ser mais um atentado — o primeiro produzido com chancela oficial — contra a liberdade de expressão cometido no governo Lula. É sobejamente conhecida a incapacidade de governos que tendem para o populismo autoritário de conviver com a liberdade de expressão. Esses governos vivem da ignorância, da manipulação das massas e da impunidade dos poderosos. Por isso, para eles, a imprensa é sempre um inimigo perigoso. *Acrescentamos comentários ao texto publicado originalmente |
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