LE MONDE - Falhas na prevenção de catástrofes no Brasil
LE MONDE Falhas na prevenção de catástrofes no Brasil As inundações fatais que atingiram, entre 20 e 23 de junho, o nordeste do Brasil, puseram em evidência graves falhas governamentais na prevenção de catástrofes naturais. O Estado de Pernambuco não dispõe de nenhum satélite meteorológico capaz de fornecer informações precisas com antecedência. Entretanto, a compra de um radar como esse representaria somente 5% do custo da construção do estádio de futebol local previsto para a Copa do Mundo de 2014. Foto: Antônio Cruz/ABr Jean-Pierre Langellier As enchentes produziram, segundo números ainda provisórios, 57 mortos, 69 desaparecidos e mais de 300 mil desabrigados nos Estados de Alagoas e de Pernambuco. Elas destruíram mais de 30 mil casas, 140 pontes e milhares de quilômetros de estradas. Os prejuízos materiais e humanos poderiam ter sido bem menores se a população tivesse sido mais bem preparada para enfrentar intempéries como essa que, apesar de ter sido de uma dimensão excepcional, acontecem com frequência nessa região equatorial. Como todos os anos, nessa estação, os ventos alísios vindos do Atlântico sopram para o continente nuvens de tempestade que se precipitam sobre a zona costeira. Desta vez dois acontecimentos térmicos amplificaram o fenômeno. De um lado, a água do oceano está mais 1,5 ° quente do que o normal. De outro, as massas de ar frio, vindas da Patagônia, se deslocaram bem mais para o norte do que o costume. Esse episódio, aliás, não tem nada a ver com o La Niña, o resfriamento periódico das águas do Pacífico. Isso explica as chuvas torrenciais que, dependendo da região, atingiram ou bateram recordes históricos de precipitação registrados nos anos 1960. Em três dias caiu tanta água quanto em um mês de um ano medianamente chuvoso. O Estado de Pernambuco não dispõe de nenhum satélite meteorológico capaz de fornecer informações precisas com três a cinco dias de antecedência. Os serviços oficiais só recebem dados de satélites, imprecisos demais. Entretanto, lembra a imprensa, a compra de um radar como esse representaria somente 5% do custo da construção do estádio de futebol local previsto para a Copa do Mundo de 2014. Na falta do equipamento, em vários municípios a aproximação do desastre foi anunciada pelos sinos das igrejas ou pelos alto-falantes de veículos municipais. O Estado de Alagoas possui um radar. Mas muitas cidades, especialmente as mais vulneráveis, não têm Defesa Civil, a rede de alerta e de assistência para as populações em perigo. Logo, dezenas de milhares de habitantes não puderam ser socorridos a tempo. De maneira mais geral, os especialistas pedem por uma reorganização da Defesa Civil, reativa demais e preventiva de menos. Além disso, os dois Estados em questão são vítimas de esquemas políticos. Não só o governo federal este ano liberou uma parte mínima (14%) do orçamento destinado à prevenção das catástrofes, como a maneira como ela foi distribuída parece altamente questionável. Segundo a ONG Contas Abertas, o Estado da Bahia, menos exposto que seus dois vizinhos, recebeu 37% do dinheiro federal, contra somente 9% para Pernambuco e 0,3% para Alagoas. Esse orçamento era administrado por Geddel Vieira Lima, até há pouco tempo ministro da Integração Nacional, atual candidato ao posto de governador da Bahia, e aparentemente um especialista em demagogia pré-eleitoral. A insuficiência da prevenção é ainda menos justificável pelo fato de que um terço das cidades e vilarejos devastados este ano já havia passado por isso pelo menos uma vez desde 2003. O aquecimento climático nessa região tropical prenuncia uma multiplicação de episódios desse tipo: no nordeste brasileiro, 2010 promete ser o ano mais quente desde o início dos registros meteorológicos, em 1880. A negligência acompanha e agrava outros erros, administrativos ou ambientais: muitas casas foram construídas à beira de cursos d’água; a população ribeirinha arranca a vegetação que poderia protegê-los das inundações; a maioria das municipalidades não aplica nenhum plano de ocupação dos solos. Mas, como observa um colunista da revista “Época”, a prevenção não faz parte do discurso político, totalmente centrado na ação imediata, pois ela “não traz votos”. *Tradução UOL: Lana Lim **Acrescentamos subtítulo, imagem e legenda |
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