De queixo caído e transpirando, Chen Weizhou olhou para um par de bonecas femininas em tamanho natural vestidas com lingerie e meias de renda. Acima dessas vamps siliconadas, um vídeo de divulgação exibia de maneira explícita o quão realista é o contato com essas bonecas uma vez despidas.
No início deste mês, Chen, um motorista de ônibus de turismo de 46 anos, visitou o Festival Nacional da Cultura do Sexo de Guangzhou apenas "por diversão". E diversão, segundo a descrição do motorista, não faz parte de seus momentos íntimos com sua esposa, que não compareceu ao evento.
"Quando você é jovem, o sexo é tão misterioso. Mas quando você se casa tudo fica bastante morno", disse ele, mal tirando os olhos da tela.
Com o tema oficial "sexo saudável, famílias felizes", a 11ª exposição anual tentou remediar a situação de homens chineses como Chen --e de suas esposas, caso eles sejam casados.
Foto: Adam Dean/The New York Times
Milhares de visitantes empunhando câmeras, muitos deles homens de meia idade, buscam pelos corredores imagens estimulantes, durante o festival
A presença esmagadora de homens no festival refletiu o desequilíbrio demográfico enfrentado pela China, país onde décadas de vigência da política do filho único e de uma preferência cultural por filhos homens, combinadas aos abortos seletivos ilegais feitos para evitar o nascimento de meninas, distorceram a proporção entre os gêneros, que em 2012 alcançou 118 meninos nascidos para cada 100 meninas, em vez dos normais 103 meninos para cada 100 meninas. Na província de Guangdong, que abriga uma população de 30 milhões de trabalhadores migrantes --a maior da China--, a escassez de mulheres deixa os homens solteiros com pouquíssimas opções.
O festival, que durou três dias e ocupou totalmente um centro de exposições aqui da capital da província de Guangdong, localizada no sul da China, foi uma espécie de ritual de acasalamento entre o capitalismo e o hedonismo, tudo diligentemente observado pela dama de companhia mais pudica que existe: o governo chinês.
O evento disponibilizou possibilidades eróticas abundantes, incluindo um show de moda transexual, chifres de veado fatiados comercializados como afrodisíaco, fantasias safadas de enfermeira e alguns objetos cor de carne desconcertantemente batizados de "Punhaladas do Capitão".
Foto: Adam Dean/ The New York Times
Um modelo distribuiu sacolas promocionais para os visitantes no festival.
Três décadas depois de a China ter começado a abandonar os costumes puritanos da era Mao, agora o sexo é um grande negócio por aqui. Por todo o país, "salões de cabeleireiro" iluminados por luzes cor de rosa e com equipes formadas por mulheres vestidas de maneira provocativa competem com casas de massagem e com acompanhantes noturnas que deslizam seus cartões de visita por baixo das portas dos quartos de hotel. Aqueles que desejam melhorar seus encontros íntimos podem fazer compras em diversas lojas de "produtos de saúde para adultos" ou pela internet.
A maioria dos produtos é fabricada na própria China. Segundo dados divulgados pela mídia estatal, mais de mil empresas chinesas fabricam cerca de 70% dos brinquedos sexuais do mundo, movimentando US$ 2 bilhões por ano, de acordo com números de 2010.
Milhares de visitantes, quase todos homens de meia-idade empunhando câmeras, lotaram os corredores do festival em busca de qualquer pedaço de carne visível.
"Os caras estão tirando fotos minhas o dia todo", disse Liang Lin, 23, uma modelo de biquíni que abraçava sua barriga nua defensivamente enquanto um bando de homens se empurrava desesperadamente para tentar obter uma imagem melhor.
Não muito longe dali, outra multidão de homens aguardava por uma minúscula estrela japonesa de filmes pornográficos chamada Rei Mizuna. Quando ela finalmente saiu de um camarim e passou a distribuir fotos picantes autografadas, seus fãs enlouquecidos avançaram em sua direção com tanto entusiasmo que quebraram a vitrine de vidro instalada no local.
Esses desejos não correspondidos ajudaram a gerar uma crescente indústria doméstica de brinquedos eróticos.
Foto: Adam Dean/ The New York Times
Visitantes fotografou uma modelo segurando um brinquedo sexual
"Um homem satisfeito não sabe o que é ter fome", explicou um vendedor em um estande cheio de bonecas infláveis. E, nesse momento, um senhor mais velho se aproximou e tentou pechinchar o preço de um modelo de US$ 8, com mechas pretas e um olhar vago.
Do outro lado do corredor, a rede chinesa Buccone vendia acompanhantes bem mais sofisticadas. As bonecas de borracha da Buccone, vendidas a US$ 6,4 mil, esquentam "como se fossem pessoas reais" e podem ser personalizadas, disse Nie Tai, 23, funcionário da empresa. "Alguns homens chegam aqui com fotos de suas esposas falecidas".
Huang Yulong, que trabalha para uma empresa de lingerie chamada Toylace, não parecia se incomodar com o fervor libidinoso do festival.
"Os homens chineses têm o fetiche de arrancar a roupa das mulheres. Por isso, eles não estão em busca de romance", disse Huang, que estava de pé, ao lado de um manequim vestindo um macacão confeccionado com o mesmo material das meias-arrastão, que parecia ter ficado sem fio ao redor da parte interna das coxas e da virilha. Ou, pelo menos, eles não estão em busca de romance com suas esposas, acrescentou ela. "Os clientes dizem que estão comprando para suas esposas, mas nós sabemos que é para suas amantes."
Em um país onde ainda é tabu discutir sexo em público, as embalagens criativas visam satisfazer uma infinidade de gostos pessoais e ansiedades íntimas. Entre as marcas de preservativos disponíveis estavam a Freud, cujas camisinhas vêm embaladas em caixas cor de rosa, e a Tiger Teeth (Dentes de Tigre), que estava posicionada ao lado de uma colorida seleção de preservativos embrulhados de forma a se parecerem com pirulitos.
Foto: Adam Dean/ The New York Times
A maioria dos produtos exibidos na feira é ‘made in China’. A China fabrica cerca de 70% brinquedos sexuais utilizando no mundo, um indústria que movimenta US $ 2 bilhões anuais
Talvez porque o foco inicial da indústria de brinquedos eróticos da China tenham sido as exportações, muitos itens exibiam um ar internacional, como o brinquedinho de mão Great Rome 5 (ou "Roma Grandiosa 5", em tradução livre) e o King Kong.
Nem todos os visitantes pareciam ser tão sem noção. Ignorando as multidões presentes no festival, uma consultora imobiliária aposentada de 66 anos acariciou um brinquedinho bastante realista --que seu marido prontamente arrematou por US$ 8.
"Quando os homens envelhecem, essa parte não funciona muito bem e eu tenho as minhas necessidades", disse a mulher, que por motivos óbvios se identificou apenas como Huang.
Ela ficou maravilhada em ver como as coisas mudaram desde que eles se casaram, em 1975. "Naquela época, durante o regime de Mao, nós não podíamos falar sobre sexo", disse ela.
Questionada sobre como eles aprenderam sobre essas coisas, Huang sorriu com ar de quem sabe das coisas e disse: "instinto".
Foto: Adam Dean/The New York Times
Boneca sexual, realista e personalizada: ao gosto do fregues
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