Pedrinhas, o presídio do terror, a vitória da barbárie no Maranhão dos Sarneys
BRASIL - Violência Pedrinhas, o presídio do terror, a vitória da barbárie no Maranhão dos Sarneys Como o desgoverno de anos resultou nos horrores dos últimos dias, desde os bandidos degolados na penitenciária até a menina Ana Clara, de 6 anos, que morreu queimada, vítima de ataque criminoso a um ônibus urbano. “O Maranhão vai muito bem”, disse três dias depois a governadora do estado, Roseana Sarney, em entrevista coletiva. “Um dos problemas que estão piorando a segurança é que o estado está mais rico, o que aumenta o número de habitantes.” Ah,tá! Divulgação Governo do Maranhão Postado por Toinho de Passira A vida da menina Ana Clara Santos Souza nunca deveria ter cruzado a de W.T.F., o bandido conhecido como Porca Preta, que aparece na foto abaixo empunhando um revólver. Aos 6 anos de idade, Ana Clara se preparava para ir à escola pela primeira vez. Adorava vestir-se de princesa e andar de bicicleta. Tinha acabado de dispensar as rodinhas da sua, e por esse motivo andava muito orgulhosa. Era um universo sem ponto de contato com o mundo sinistro habitado por Porca Preta. O bandido, de 17 anos, é um dos membros do Bonde dos 40, a sanguinária facção criminosa que disputa o mercado de drogas de São Luís e domina parte das cadeias do Maranhão à base de métodos que incluem a decapitação de adversários e o estupro de suas mulheres. O que fez com que Ana Clara e Porca Preta se encontrassem no último dia 3 não foi o azar, mas uma combinação de duas tragédias: a situação nacionalmente calamitosa das prisões brasileiras e a gestão particularmente funesta do problema pelo governo do Maranhão, onde o descaso, o apadrinhamento e o descontrole elevaram o horror a uma escala nunca vista. Parte desse horror transbordou na semana retrasada para uma rua da periferia da capital maranhense. Da prisão de Pedrinhas, partiu a ordem para que bandidos atacassem ônibus em circulação na cidade em represália à entrada da Polícia Militar na cadeia depois de mais uma rebelião sangrenta. Um dos alvos escolhidos foi o carro em que haviam embarcado Ana Clara, sua mãe, Juliane Souza, e a irmã de 1 ano, Lorane. Porca Preta foi o encarregado de render o motorista, enquanto seus comparsas espalhavam gasolina no interior do veículo. Juliane, internada em estado grave, contou à mãe o que houve em seguida. Segundo disse, ela e as filhas já estavam na porta de entrada quando alguém riscou um fósforo e o ônibus explodiu em chamas. As três foram atingidas. Juliane atirou-se sobre a caçula e, com as costas e os braços queimando, rastejou com ela por baixo da roleta em direção à porta de trás. Achava que a filha mais velha a seguia. Ana Clara, no entanto, havia se desgarrado e permaneceu na parte da frente, onde as chamas ardiam altas. Com 95% do corpo queimado, ela ainda conseguiu sair do carro. São excruciantes as imagens feitas pelas câmeras de segurança do ônibus, que mostram a menina perambulando em choque, sozinha, com o corpo em chamas. Ana Clara morreu na última segunda-feira.
“O Maranhão vai muito bem”, disse três dias depois a governadora do estado, Roseana Sarney, em entrevista coletiva. “Um dos problemas que estão piorando a segurança é que o estado está mais rico, o que aumenta o número de habitantes.” A entrevista girou em torno da série de motins no Complexo de Pedrinhas, que deu origem ao ataque ao ônibus em que viajava Ana Clara e, em 2013, resultou em sessenta presos mortos, ao menos cinco degolados. Roseana disse ainda que o que houve em Pedrinhas foi “inexplicável”. A governadora conseguiu errar em cheio em todas as declarações. Primeiro, o Maranhão, estado que sua família governa há cinco décadas, não vai nada bem. Tem o segundo pior índice de analfabetismo do Brasil e a pior renda per capita. Seu IDH só perde para o de Alagoas, e a mortalidade infantil é a segunda maior do país. Depois, o que aconteceu em Pedrinhas está longe de ser inexplicável. Foto: Manoel Marques - Reprodução - Francisco Silva/Jornal Pequeno Na semana passada, a reportagem de VEJA percorreu cinco das oito unidades do complexo - com capacidade para 1 500 presos e população de 2 700. Nas celas de 6 metros quadrados espremem-se até dez homens, obrigados a disputar espaço com os ratos, atraídos pelos detritos acumulados em pilhas por todo canto. No pátio de uma das cadeias do complexo, o esgoto a céu aberto se mistura a montes de entulho e mato crescido. Algumas paredes dão a impressão de que poderiam ser derrubadas com um chute, de tão decrépitas. Foto: Marlene Bergamo/Folhapress Para o Palácio do Planalto, o governo do Maranhão está despreparado para resolver sozinho a crise no sistema carcerário estadual. A gestão sofreria de “autismo” e de “completo distanciamento da realidade”, como teria demonstrado a licitação para compra de lagosta e outros quitutes, suspensa depois de revelada pela Folha de S.Paulo e substituída por outra... que solicita caviar e uísque escocês. Embora assessores de Dilma Rousseff digam que Roseana Sarney perdeu capital eleitoral, a presidente não pretende dispensar o apoio da governadora e de seu pai, o ex-presidente do Senado e cacique peemedebista José Sarney. Foi por isso que a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, evitou defender a intervenção federal no estado e foi por esse motivo também que, diante de tanto sangue derramado em território maranhense, Dilma limitou suas manifestações a uma lacônica mensagem postada na sexta-feira no Twitter. O texto diz que ela acompanha “com atenção a questão da segurança no Maranhão”. Ana Clara não andará mais de bicicleta, não se vestirá de novo de princesa nem irá à escola neste ano pela primeira vez. Mas é tranquilizador saber que a presidente acompanha tudo com atenção. E que o Maranhão vai muito bem, obrigado. *Alteramos título, acrescentamos subtítulo, foto e legenda à publicação original |
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